Design de armadilhas

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A gente fica vendo o noticiário que mais parece cinema-catástrofe e quase não acredita como as coisas chegaram nesse ponto. Vamos recapitular, então.

Até a revolução industrial, o mundo andava aos trancos e barrancos como sempre, mas, porque a população ainda não era tão grande, o estrago também não era tão visível.

Mas a produção em série de objetos fez com que se precisasse também consumir em escala. Afinal, de que adianta produzir tanto se não tiver quem compre? O deslumbramento com a tecnologia e o conforto transformou o progresso numa espécie de religião.

Depois veio o American Way of Life, o ideal de costumes desejado no mundo todo. Ainda hoje essa é uma referência importante de bem viver; o problema é que, só para citar alguns números, um único americano de classe média consumia, em 1990, energia equivalente a 3 japoneses, 6 mexicanos ou 531 etíopes. Quer se assustar? Saiba que para produzir uma latinha de refrigerante se gasta 60 litros de água e para fazer uma única calça jeans são precisos 1914 litros do precioso líquido. Assim fica difícil, né?

Se o mundo todo vivesse com esse estilo de vida (que, por sinal, a gente vive hoje em Florianópolis), precisaríamos de 3 planetas terra. E o pior é que esse cálculo considera a população de 2008, que não pára de crescer; sem contar que a China e a Índia estão botando as manguinhas de fora e aquele povo todo quer conforto também, como qualquer ser humano.

E o que o design tem a ver com isso?

O design ajudou, com entusiasmo, a construir essa bela ratoeira em que nos metemos. Ajudou a fabricar em escala, ajudou a seduzir em escala, ajudou a vender em escala. Agora, nada mais justo do que ajude a desmontar a armadilha também.

O modelo de progresso baseado no consumo é totalmente insustentável, mas a gente ainda não faz idéia de como escapar dele. O pessoal do primeiro escalão está lá em Copenhagen dando tratos à bola, mas não penso que vão sair de lá com uma resposta.

Do jeito que a coisa foi montada, para o mundo continuar girando, a gente precisa consumir sempre mais. É só lembrar dos efeitos ainda recentes da crise mundial. Se as pessoas compram menos carros ou menos geladeiras, muita gente perde emprego e tudo desmorona como um dominó. No desespero, o governo reduz impostos para aquecer a economia, que significa recuperar o consumo. Sem consumo, a roda pára de girar e a miséria se populariza. Eu e você ficamos sem trabalho. Quem quer esse cenário?

O consolo é que o design pode ajudar a aumentar a nossa sobrevida enquanto não encontramos a cura para a doença. Só que temos que virar do avesso tudo o que usamos até hoje como referência, pensar o que nunca foi pensado antes. Um baita problemão.

Desmaterializar os produtos, tornando-os mais conceituais que físicos; transformar o hábito de ter no hábito de usar (não precisamos possuir para usufruir de algo, temos que focar em serviços, não em produtos); projetar pensando em reduzir insumos e dejetos; criar pensando no ciclo de vida completo, mais longo e conseqüente; inserir o conceito de interdependência no processo produtivo; enfim, são alguns caminhos que podem ajudar, mas não resolvem. Se os recursos são finitos, a população não pode crescer indefinidamente, por menos que se consuma. É matemática básica…

O que a gente vê é esse planetinha azul sendo maltratado sem dó, transformando-se num velho decrépito e temperamental cheio de acessos de fúria vingativa. E o resultado são dilúvios bíblicos, ventos, secas, furacões e derretimento de geleiras, cada vez mais freqüentes nas primeiras páginas.

Pois é. Por falar em geleiras, sexta-feira (11 de dezembro), parto para uma viagem de moto até o glaciar Perito Moreno, na Patagônia argentina. Vamos ver aquela maravilha antes que acabe, pois o tempo urge e não sabemos quanto tempo o espetáculo ainda vai ficar em cartaz.

Quer vir junto? Sobe na garupa do www.duasmotos.com/blog e vem com a gente (vai ter atualização com fotos e vídeos durante a viagem).

Vamos garantir uns dias de amnésia porque, pelo que tudo indica, 2010 vai ser bem emocionante e cheio de desafios bem difíceis para a gente ajudar a resolver.

Muita criatividade para todos nós nesse futuro incerto que nos aguarda!

Ligia Fascioni | www.ligiafascioni.com.br

3 Responses

  1. 8 dezembro 2009 at 11:29 pm

    mas esse foi um self-made design. :@ 😛

  2. 12 junho 2010 at 9:35 am

    Excelente artículo! Aprendí mucho leyéndolo, gracias. Si te interesa, yo tengo un blog con mucha información sobre el Cabello Lacio.

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