Empatia: nunca vi, nem comi, só ouço falar.

Ligia Fascioni

Se você sair por aí perguntando que características as pessoas gostariam de melhorar, as respostas mais frequentes seriam: paciência, força de vontade, disciplina, inteligência, etc. As variações seriam muitas, mas é quase certo que, além do bom senso (que todos acreditam ter o suficiente), o outro item que não apareceria na lista seria a empatia.

E olha que empatia está na moda, a julgar pela quantidade enorme de frases de efeito que vêm circulando nas redes sociais (até um museu da empatia abriu em Londres; muito bacana).

Mas aí a pessoa curte todas as matérias sobre o tema e logo depois publica 5 selfies feitas na academia seguidas da foto de seu prato de almoço e da preciosa informação: “partiu aeroporto!”.

Com Fan Pages não é diferente: em textão, textinho, animação ou meme; empatia é a palavra de ordem. Logo em seguida a empresa pede colaboração para conseguir mais likes para a página (estamos quase chegando nos xxx mil!!).

Analisemos o fenômeno.

Empatia, todos sabemos, é a capacidade de se colocar no lugar do outro, sentir o que ele sente, experimentar o que ele experimenta. Mas por que deveríamos desenvolver essa qualidade? Para entender o mundo com mais clareza, para amar melhor, para ampliar nossos horizontes, para sair do mundinho centralizado no nosso umbigo. Praticar empatia significa reconhecer que não sou o centro do universo, significa focar nossa atenção no outro.

Pelo menos para as empresas, essa habilidade deveria ser usada para conseguir compreender o que é valor para a pessoa que está do outro lado, o que é importante para ela. Se a empresa consegue entender isso, vai se comunicar melhor com seus clientes e colaboradores, vai se conectar com eles.

Em minhas consultorias para empresas, não raro alguém pergunta: olha que bacana, vamos publicar isso na Fan Page? Vamos dar isso como brinde? Minha pergunta (sempre!): isso é valor para seu cliente?

Uma pergunta tão simples e básica, minha gente. É valor para mim, como cliente, se a empresa tem 10, 100 ou 1 milhão de likes? Não sei vocês, mas para mim tanto faz. Diferença zero na minha vida.

É valor para alguém ganhar uma sacola maravilhosa cuidadosamente estragada pela estampa gigantesca de uma marca? Já falei e repito; presente com empatia tem a marca da empresa bem pequena e do lado de dentro, para a pessoa se lembrar da gentileza, não ficar com raiva e ter que doar o mimo por impossibilidade de uso sem parecer um outdoor.

É valor para mim, como colaborador da empresa, ter como prêmio de desempenho um final de semana em Miami, considerando que não tenho visto, minha mulher não pode ir junto por causa do trabalho e estou com um filho doente em casa?

É valor para mim, como cliente, saber se a empresa bateu a meta de vendas desse mês? Se o funcionário tal fez aniversário? Se o presidente apareceu na coluna social? Se recebeu a visita de fulano, que é famoso?

Algumas dessas informações têm valor sim, mas para segmentos específicos: seus colaboradores e acionistas, talvez. Em alguns casos, para fornecedores e parceiros também. Então, o lugar de publicá-las não é na página em que os clientes têm acesso, mas no espaço dos colaboradores e parceiros, por exemplo.

É claro que depende de cada empresa e do perfil de quem vai ler a notícia ou receber o presente; não há uma regra que valha para todo mundo. Valor é uma coisa subjetiva e muito difícil de mensurar; há que se estudar cada questão cuidadosamente da maneira mais empática possível.

Nos perfis pessoais e profissionais, se a pessoa valoriza a empatia, vale a mesma coisa: será que isso é valor para quem está lendo?

Pensemos: para quem é valor uma foto do meu guarda-roupa novo? Minha mãe, minha colega de quarto, minha prima que está pensando em comprar um também? Então, olha, são três pessoas. Para que compartilhar essa informação com mais 3 mil que não se interessam pelo assunto?

Para quem é valor saber quantos km você correu hoje? Seu grupo de amigos que pratica corrida? Beleza, por que então não mandar essa informação somente para eles, em vez de informar toda a sua timeline, que inclui colegas do curso de direito tributário, parentes distantes, sua contadora, seu grupo de literatura comparada e seu dentista?

Ressalto: não quero fazer o papel de polícia da internet, apenas convidar à reflexão. Obviamente cada um faz o que quer com o espaço que possui. Inclusive porque o conceito de valor é bem vago.

Não há certo ou errado, é pessoal mesmo, não dá para colocar regras. Mas dá para tentar se colocar no lugar do outro, imaginar qual o impacto daquilo que a gente está compartilhando vai ter lá na outra ponta. Não vamos acertar sempre, mas com certeza, seremos menos inconvenientes. Vamos tornar a vida de quem está do outro lado um pouco melhor (ou menos ruim, que seja). E não é essa a ideia da empatia?

Então, se a você concorda mesmo que falta empatia no mundo, fica a sugestão para começar agora mesmo. É só responder à pergunta básica e simples antes de publicar ou oferecer algo: “isso é valor para quem está do outro lado?”

***

Espero sinceramente que esse texto tenha valor para alguém 🙂

5 Responses

  1. Everson
    Responder
    7 outubro 2015 at 2:49 pm

    Esse texto foi muito valoroso para mim. O que mais me identifiquei foi com as notificações do nike+ de quanto corri cada dia, mas é que o facebook tem um mecanismo bacana de pegar as corridas e fazer as contagens e cálculos juntando tudo em um link. Aí eu penso “Ah, mas o facebook também tem o algoritmo que não mostra muito os posts irrelevantes”, aí eu deixo. Mas a empatia é importante mesmo. Até no dia-a-dia, se você for conversar com alguém e só querer ser ouvido, falar das suas conquistas e nunca escutar a outra pessoa vai se tornar insuportável, quando deveria ser o contrário, ouvir mais a pessoa.

    • ligiafascioni
      Responder
      7 outubro 2015 at 3:59 pm

      Oi, Everson! Não tem um mecanismo para publicar apenas para um grupo menor (talvez somente você e mais alguém que também corra)? Pode ajudar 🙂

  2. 20 outubro 2015 at 4:24 pm

    Estamos numa fase de muito discurso e pouca ação.
    Bj e fk c Deus
    Nana
    http://procurandoamigosvirtuais.blogspot.com

  3. Liu
    Responder
    21 outubro 2015 at 4:50 pm

    Não concordo que falte empatia. Falta empatia em achar que se eu vou dizer que corri não estaria inspirando outras pessoas que ainda não estão no meu grupo de corrida? E o meu guarda-roupa novo, será que não há alguma coisa em que não desperte um “que legal seu guarda-roupas novo, faz tempo que a gente não se vê, você se mudou? vamos nos ver?” faz parte do “networking” você resgatar contato com as pessoas e que melhor maneira de fazê-la se não em um post onde a pessoa está aberta a dizer sua própria novidade?
    Se formos manter cada um no seu quadradinho com seus assuntos, daí sim eu diria que a empatia morreu!

    • ligiafascioni
      Responder
      22 outubro 2015 at 4:14 am

      Oi, Liu!
      Você tem toda razão, mas isso não contradiz o texto. Para o seu público, de fato a sua corrida e o seu guarda-roupa novo podem se interessantes e informações de valor por vários motivos. Para o meu, por exemplo, não é. Por isso é que salientei várias vezes que não há regras prontas, cada caso é um caso. E você destacou muito bem situações em que a informação é valor para algumas pessoas, e para outras não. Essa é justamente a ideia; colocar-se no lugar de quem está no outro lado.
      Obrigada pelo contraponto!

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