Muito barulho por nada

Fotografia: Steve Peixotto e Ross Brow

Está rolando uma polêmica na internet por causa de um site, veiculado na imprensa como inovador, no qual o cliente decide quanto quer pagar por uma marca gráfica. Designers (ou não) postam suas propostas e ele escolhe a que acha melhor, numa espécie de leilão ao contrário (o cliente define o preço e os profissionais disputam os projetos).

Pois as comunidades de design estão cheias de gente espumando de raiva, inconformados com o modelo de negócio. Alegam que design é coisa séria demais para ser vendido num feirão, sem nenhum critério, desvalorizando o conhecimento que o profissional deve ter para fazer um trabalho bem feito.

Bom, vamos analisar primeiro a inovação do serviço. Na verdade, o modelo sempre existiu. Não é de agora que o cliente decide quanto quer pagar nem o que quer comprar. O que o site fez foi organizar essa forma de trabalho, colocando as partes em contato direto. E, que fique claro, todas as partes envolvidas são maiores de idade e estão lá por livre e espontânea vontade.

Muita gente alega que isso é prostituição da profissão. Ok, e daí? O que há de errado com a prostituição? Há prostitutas que fazem ponto na esquina, bem baratinhas, e há as de luxo, que falam línguas e acompanham executivos. De fato, o cliente escolhe o serviço que quer de acordo com o orçamento disponível. Ele paga por aquilo que tem valor para ele. E ponto.

Acompanhei discussões onde alguns profissionais estavam preocupados com banalização do processo de elaboração de marcas gráficas. Ora, se os clientes acham que qualquer um pode fazer uma marca, a culpa é deles? Na minha opinião, a culpa é dos designers mesmo. Se alguém compara duas opções muito diferentes em pé de igualdade, é porque quem fez o trabalho mais elaborado (e caro), não conseguiu deixar clara a diferença. E isso é responsabilidade do designer e de ninguém mais.

Será que as grandes empresas de design estão perdendo o sono por causa desse site? Acredito que não, justamente porque conseguem deixar claro para seus clientes que uma marca gráfica não é só um desenho; há muito trabalho por trás, há estratégia, há planejamento, há conceito. Não pode ser feito por qualquer um, dá mais retorno ao negócio, VALE MAIS. Mas tem muito designer aí que só entrega um desenho mesmo. Então, tem mais é que arrancar os cabelos de preocupação (se é que já não estava careca, pois o mercado está assim selvagem não é de hoje).

Alguém aí já comprou um sofá numa daquelas lojas de móveis populares? São feios, mal-acabados, ergonomicamente desastrosos, mas baratos. Já vi mais de uma pessoa ficar feliz da vida com a aquisição. Quem sou eu para dizer que o sofá não presta? Penso que funciona da mesma maneira para qualquer serviço – se quem comprou ficou satisfeito, não há mais nada a discutir. Não adianta eu convencer o sujeito que  um sofá projetado por Charles e Ray Eames é infinitamente superior. Para ele, aquele está bom que chega, muito melhor sintonizado com a sua realidade e seu gosto. Como alguém ousa dizer que o sujeito está errado?

Penso ser muita prepotência decidir o que é melhor para os outros; o que eles devem consumir, a quem devem contratar. Quantos designers por aí contratam técnicos eletricistas com carteirinha do CREA para instalar o chuveiro? Teoricamente eles são melhores, mais confiáveis. E olha que, nesse caso, estamos falando de sua segurança pessoal – você pode morrer eletrocutado se o sujeito fizer bobagem. Mas os designers estão errados se contratam o seu Zé? Penso que não. O cliente decide o quanto quer pagar e SEMPRE tem consciência de que o que vai receber em troca é proporcional a isso. Fato.

Quer sair fora dessa bagunça? Mostre a diferença, faça-se desejado. Leve a palavra inovação realmente a sério. Lembre-se de que o que é mais raro, é mais caro. O que tem em todo lugar, só pode ser baratinho. Ofereça algo a mais, que seja percebido como importante e essencial pelo cliente. Aprimore sua comunicação. Ouça mais, apure os sentidos. Concentre-se em entregar valor. O pessoal do feirão está todo oferecendo mais do mesmo – você realmente quer competir com eles?

A Starbucks não se preocupa se na esquina da sua loja tem uma padaria vendendo cafezinho por um quinto do preço. E os designers sabem exatamente o porquê dessa tranquilidade. Ou deveriam saber. E se não sabem, como querem oferecer mais que desenhos para seus clientes?

Lígia Fascioni | www.ligiafascioni.com.br

14 Responses

  1. Andre Felipe
    Responder
    15 fevereiro 2011 at 2:50 am

    Estive compartilhando esse assunto essa semana na faculdade, e tenho uma visao muito parecida com a sua. Logico que num primeiro momento, fui muito critico, mas e indiscutivel como uma proposta como essa, evidencia quem são os “homens” e os “meninos”. O resultado final é a percepção do cliente, e só dele. E como você bem colocou, tem cliente que só precisa de um sofá popular. Talvez os “sobrinhos que mexem legal no Corel”, iram ficar preocupados.

  2. Paulo
    Responder
    15 fevereiro 2011 at 8:56 am

    Muito bom o seu artigo. O Brasil precisa de mais pessoas com definições claras, como as suas. Enquanto uns apontam os erros e enlouquecem com as feitorias de algumas pessoas (mesmo sendo equivocadas), outros utilizam seu tempo para crescer, acrescentando algo à sociedade. Acredito que isso sempre ocorrerá em todas as áreas, no momento vejo muito forte no design brasileiro, por falta da capacitação de alguns profissionais.

  3. 15 fevereiro 2011 at 9:07 am

    Oi Ligia,

    Esse tipo de site não prejudica os grandes escritórios estabelecidos.
    Ele prejudica o profissional médio, as médias agências e os designers freelancers.

    Compreendo perfeitamente que esses clientes não são interessantes para a maioria dos grandes designers estabelecidos. Mas, querendo ou não, esse tipo de proposta cria uma nova cultura no mercado.

    Por conta disso, de uns anos pra cá, os valores cobrados pela criação de um logotipo caíram drasticamente. Infelizmente, esse foi o tipo de projeto que mais sofreu com a invasão de oportunistas, sobrinhos e curiosos em geral.

    Há poucos anos, era fácil conseguir um valor justo por um logotipo. O profissional podia se dedicar aos estudos, às pesquisas e às análises. Já cheguei a visitar museus para compreender a história da imigração italiana, quando tive que fazer um logotipo de uma padaria centenária em São Paulo.

    Hoje, isso seria impossível. Por conta disso, não faço mais trabalho de criação de logotipos. Não sei trabalhar na superfície.

    Quem perdeu? Os clientes pequenos e médios, que serão obrigados a procurar ou o ‘site quitanda’, ou o escritório carésimo.

    Segundo a opinião de um brilhante colega designer, esses ‘sites quitandas’ retiram do profissional médio (nem grande, nem medíocre) uma imensa fatia do bolo e obriga-o a correr atrás de um outro tipo de bolo ou simplesmente adequar-se ao sistema imposto pelo site. E, convenhamos, é uma decisão difícil e extremamente frustrante.

    Pois é, a vida não é feita só de pretos e brancos.

    Abraços,

    Mônica

    • ligiafascioni
      Responder
      15 fevereiro 2011 at 9:16 am

      Oi, Mônica!

      Como sempre, muito lúcida. Com certeza você tem uma visão do mercado de design melhor que a minha (já que não sou designer) e costumo olhar mais sob o ponto de vista do cliente.

      Mas todos (ou quase todos) os grandes estúdios começaram pequenos, com um ou dois designers somente. E porque alguns crescem e outros estacionam? Por que alguns conseguem desenvolver uma marca respeitável e cobrar o preço justo, enquanto outros ficam patinando?

      Para mim, é a lição de casa: branding. Gestão de marca. Continuo acreditando que o trabalho do designer não é só fazer uma bela marca, bem conceituada e com pesquisa. Penso que isso já não basta mais no mercado (nem para os designers, nem para os clientes). É preciso estratégia, posicionamento claro, marketing.

      Se o designer fez a lição de casa, então conhece o processo e pode vender isso ao cliente. Senão conhece, só pode oferecer uma marca bem construída, que não é suficiente como diferenciação.

      Por isso eu disse que é importante levar a palavra inovação realmente a sério. O mundo mudou, para o bem ou para o mal. O que era bom e suficiente, não é mais….

      Abraços da sua fã!

  4. 18 fevereiro 2011 at 1:57 pm

    Olá Lígia, como vai?

    Ótimos os pontos expostos. Gostei em especial de sua atenção à importância da inovação no mercado de design. Quem fizer “mais do mesmo” fica sem espaço, cedo ou tarde.

    Elaborei um artigo abordando como o WeDoLogos pode ser uma porta de entrada no mercado para estudantes de design e a primeira oportunidade para micro empresas/profissionais autônomos “experimentarem” o design. Quando puder acesse:
    http://www.guiacmyk.com.br/blog/wedologos-e-a-discussao-sobre-o-valor-do-design

    Abraços,
    Leonardo Almeida
    guiaCMYK: a nova forma de contratar gráficas.

    • ligiafascioni
      Responder
      18 fevereiro 2011 at 4:20 pm

      Oi, Leonardo!

      Penso que esse pode ser realmente um caminho para recém-formados (apoio totalmente o trabalho de graça em ONGs).

      Mas acho que o modelo do WeDoLogos não tem muito a ver com design. Um comentário no blog espaço design deu conta que o primeiro lugar do WeDoLogos apresentou centenas de alternativas e conseguiu ganhar pouco mais de R$ 300. Ora, esse rapaz não está fazendo design, ele está se divertindo e desenhando para ver se alguma coisa cola.

      Como eu disse, não posso ser contra nem quem contrata e nem quem oferece serviços num site assim, mas não posso me furtar de duvidar da qualidade do serviço (ninguém consegue fazer um trabalho sério de design criando centenas de logos em poucos dias).

      Uma alternativa para o pessoal que quer vitaminar o portfólio, seria montar uma central de design apenas para entidades sem fins lucrativos, onde a marca seria desenvolvida com método e de maneira séria, por preços simbólicos.

      Mas isso ainda vai dar muito pano para manga…eheheh

  5. 24 fevereiro 2011 at 11:53 am

    Só tenho uma coisa a dizer… Suas colocações e seu texto está perfeito. Compartilho igualmente da sua opinião. Parabéns !

  6. 17 setembro 2011 at 4:28 pm

    Olá Lígia,

    Você colocou de forma bem interessante essa discussão que está tirando o sono de muitos designers e afins.
    Reforça, e muito, uma ideia que cultivo: o cliente é o foco, ou deveria ser, do trabalho do designer. E não a comunidade de designers pelo mundo. Muitos trabalham para agradar aos designers e se esquecem dos próprios clientes.
    Há clientes que podem pagar milhares de dólares por uma identidade visual. Mas, outros reclamam quando pedem R$ 500,00.
    Mas, o que eu acredito ser o mais importante é que o pequeno cliente procurou um designer para o serviço. Ele percebeu a necessidade e buscou pelo serviço.
    Em outras épocas ele nem saberia da sua existência. Buscaria o filho da vizinha que gosta de desenhar.
    Cabe à cada um valorar seu trabalho. Não se depreciar quando reclamarem do preço cobrado e viver feliz.
    E quando aparacer um que pague pelo que você cobra, surpreenda-o com um resultado surpreendente. Superando suas expectativas.
    Procurar aproveitar as oportunidades de trabalho que aparecem e fazer dessas uma ponte para seus próximos clientes.
    Parabéns pelo artigo.
    Forte abraço.

  7. 19 setembro 2011 at 7:42 pm

    Olá Lígia,

    meu blog foi um dos campos de batalha onde opiniões divergentes se digladiaram sobre esse tema.
    Sua argumentação tem sentido, lógico. Mas os pontos mais sutis são os que, na minha opinião merecem mais atenção. A comparação com os sofás não é feliz. Não vendemos mercadoria, não somos commodity. Lógico, se vc acha um saco de cimento mais barato, pode comprar.
    A comparação é se você leva seu filho num médico beeeem baratinho. Ou num dentista de fundo de quintal. Um que talvez nem tenha diploma, seja só um protético esforçado. Não, né? E se pessoas mais pobres levam, não significa que deveriam.
    Minha opinião contra esses sites é a criação de duas ilusões. A primeira, de que o cliente vai sim, ser bem atendido por esse serviço. A outra é que um designer pode ganhar uma “boa grana” fazendo logotipinhos para esse site.
    A verdade é que o cliente estará quase sempre com um serviço mal feito e incompleto, e o designer perderá muito mais concorrência do que ganhará. Além disso, não gera relacionamento. O designer que atende o cliente não poderá evoluir com a convivência com a marca e nem o dono da marca terá alguém que realmente a entende.
    Enfim… talvez seja muito barulho… mas não é por nada…

    • ligiafascioni
      Responder
      20 setembro 2011 at 12:06 pm

      Oi, Rodrigo!
      Entendo perfeitamente seu argumento e concordo que design é serviço, não produto. Usei o sofá apenas para ficar mais didático e depois, voltando aos serviços, usei o eletricista com carteirinha do CREA. Só por curiosidade: você conhece algum designer que contrate eletricistas com carteirinha do CREA para fazer instalações elétricas em casa? Eu não. Você já contratou?

      O que discuto aqui é a defesa de posições que os próprios defensores não praticam. Não estou fazendo juízo de valor, é uma opção de cada um – mas se vale para os designers, por que não valeria para os clientes?

      Em tempo: tem um designer americano que defende que nenhum designer deveria se formar sem ter contratado outro designer para desenvolver sua própria marca e a preços de mercado. Concordo com ele que isso é fundamental para um melhor entendimento das complexidades do mercado.

      Por último, mas não menos importante: ao contrário do que talvez possa parecer, defendo sim os designers, mas aqueles com visão de mercado mais amplas – esses jamais são confundidos com micreiros….

      Abraços e obrigada pelo comentário. Sucesso!

  8. Mauricio
    Responder
    22 maio 2012 at 5:46 pm

    Mas qual e esse site afinal?

  9. 2 junho 2014 at 6:29 am

    Bom dia Ligia adorei o seu post e concordo que esse tipo de site não deveria atrapalhar o processo de trabalho dos designers. Você fala que grandes estúdios não são afetados, mas será mesmo. Antigamente grandes estúdios tinham 300 funcionários hoje esses mesmos estúdios quando muito possuem apenas 50 funcionários. Será que a lucratividade está a mesma?
    Hoje em dia vivemos uma época em que um tênis Nike de R$ 700, concorre com um celular de R$ 700 e que também concorre com uma viajem pelos mesmos R$ 700. Tudo concorre entre si. Eu li em algum lugar que os ilustradores ingleses, os mais bem pagos do mundo, reclamam que o valor das ilustrações caiu muito nos últimos 50 anos. Mas o problema real nessa situação do 99 design e we do logos nem é isso. Se o dono desse site deseja contratar 100 pessoas é um problema dele. Vai que o cara achou uma forma mágica de fazer esse negócio viável. Ele até achou. Essa formula se chama TRABALHO ESCRAVO. Quase todos concordamos que trabalha nesse tipo de site quem quer, mas no Brasil, e em todos os países civilizados, todas as pessoas que trabalham devem ser pagar. Imagine a seguinte situação. Você contrata no seu escritório 20 estagiários e não pagam nenhum deles. Seria ótimo em relação ao custos. Mas seria correto? Isso seria o bom e velho TRABALHO ESCRAVO. A lei brasileira é bem clara em falar que todo empregador é obrigado a pagar no mínimo um salário mínimo ao seu trabalhador. Isso é lei. TRABALHO ESCRAVO É CRIME E DEVE SER DENUNCIADO.

  10. Marina
    Responder
    13 dezembro 2016 at 10:36 am

    Gostei do post e quero também recomendar.
    Eu gostei muito do trabalho dos profissionais da http://99marketingdigital.com.br
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