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{"id":1483,"date":"2009-01-29T15:50:03","date_gmt":"2009-01-29T15:50:03","guid":{"rendered":"http:\/\/ligiafascioni.wordpress.com\/?p=1483"},"modified":"2009-01-29T15:50:03","modified_gmt":"2009-01-29T15:50:03","slug":"criatividade-sem-dono","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.ligiafascioni.com.br\/criatividade-sem-dono\/","title":{"rendered":"Criatividade sem dono"},"content":{"rendered":"

\"1217426369pxduqsm\"<\/p>\n

\u2014 N\u00e3o repara n\u00e3o, \u00e9 que trabalho com criatividade, ent\u00e3o n\u00e3o entendo muito esses n\u00fameros (nem gosto, isso \u00e9 coisa para nerds).<\/p>\n

\u2014 Pois \u00e9, a \u00e1rea t\u00e9cnica \u00e9 muito limitada. Por isso escolhi trabalhar com criatividade.<\/p>\n

\u2014 Sabe o que \u00e9? N\u00e3o fico bitolado nesses detalhes t\u00e9cnicos porque sou muito criativo, viajo mesmo.<\/p>\n

<\/p>\n

Vivo escutando essas frases de designers, publicit\u00e1rios, ilustradores, artistas pl\u00e1sticos e todos esses profissionais que se convencionou chamar \u201ccriativos\u201d. \u00c9 praticamente um consenso: eles s\u00e3o a parte criativa da sociedade. O resto das pessoas \u00e9 bitolada, um pouco limitada, tem dificuldade para entender arroubos de inova\u00e7\u00e3o. Eu aceitava isso sem questionar muito. Mas, esses dias, ao ouvir pela en\u00e9sima vez essa f\u00f3rmula t\u00e3o pouco criativa, comecei a question\u00e1-la.<\/p>\n

De um lado se colocam os nerds<\/em> (engenheiros, t\u00e9cnicos, programadores, f\u00edsicos, matem\u00e1ticos). Do outro est\u00e3o os \u201ccriativos\u201d (designers, publicit\u00e1rios, escritores, artistas). Ser\u00e1 que a criatividade \u00e9 mesmo distribu\u00edda de maneira assim t\u00e3o bin\u00e1ria no mercado de trabalho?<\/p>\n

Vejamos. A primeira coisa que me vem \u00e0 mente \u00e9 que os chips eletr\u00f4nicos s\u00e3o feitos de sil\u00edcio. E sil\u00edcio, em \u00faltima inst\u00e2ncia, \u00e9 um tipo de areia. F\u00edsicos, qu\u00edmicos e engenheiros precisaram encontrar maneiras mirabolantes para adestrar essa areia e transform\u00e1-la em computadores, telefones celulares e televisores de alta resolu\u00e7\u00e3o. Como convencer gr\u00e3os de areia a fazerem o que voc\u00ea quer? Como sequer imaginar que gr\u00e3os de areia sejam t\u00e3o talentosos? Mais que ser criativo, esse povo precisa literalmente tirar leite de pedra…<\/p>\n

Olha s\u00f3 o caso dos programadores. \u00c9 esse povo bizarro que traduz linhas de c\u00f3digo escritas em l\u00ednguas esquisit\u00edssimas no sistema operacional e nos softwares que os criativos usam para desenhar, alterar, distorcer, tratar e animar imagens que antes s\u00f3 viviam numa folha de papel. Existem infinitas maneiras de se escrever um programa \u2013 o programador tem que usar toda a sua capacidade criativa para encontrar a melhor solu\u00e7\u00e3o usando o m\u00ednimo de recursos computacionais. \u00c9 quase como o trabalho de um escritor; o programador precisa dizer para o computador o que ele tem fazer (sem deixar d\u00favidas) em um m\u00ednimo de palavras muito bem escolhidas.<\/p>\n

Achar um erro num programa ou numa placa de circuito impresso \u00e9 um trabalho de detetive que exige tanta criatividade quanto um investigador policial. \u00c9 preciso colher pistas, testar possibilidades, pensar o que ningu\u00e9m pensou, ser absurdamente original.<\/p>\n

F\u00edsica \u00e9 outro lugar onde a criatividade \u00e9 essencial para se evoluir. Para mim, a teoria da relatividade \u00e9 a demonstra\u00e7\u00e3o mais cabal do pensamento lateral aplicado no seu limite. Vale o mesmo para a matem\u00e1tica.<\/p>\n

No caso das telecomunica\u00e7\u00f5es, entender como funciona a comunica\u00e7\u00e3o entre os sat\u00e9lites e as antenas de um mero telefone celular, \u00e9 de dar dor de cabe\u00e7a. \u00c9 necess\u00e1ria muita, mas muita mesmo capacidade de abstra\u00e7\u00e3o. Reunir um volume gigantesco de informa\u00e7\u00f5es, tentar combina\u00e7\u00f5es improv\u00e1veis, bolar meios de fazer as conex\u00f5es, tentar caminhos novos, suplantar os infinitos problemas que aparecem no caminho e mesmo assim fazer funcionar sob press\u00e3o. Isso n\u00e3o \u00e9 usar a criatividade? Ent\u00e3o o que \u00e9?<\/p>\n

N\u00e3o quero, de maneira alguma, defender aqui que uma fun\u00e7\u00e3o seja mais ou menos importante que o outra, j\u00e1 que todas se complementam. Tamb\u00e9m n\u00e3o tem nada a ver com n\u00edveis de intelig\u00eancia, j\u00e1 que o profissional tem que ser muito bom para fazer uma coisa realmente original, seja que coisa for, em qualquer \u00e1rea. O que gostaria de chamar aten\u00e7\u00e3o, \u00e9 que \u00e0s vezes a gente acaba considerando um trabalho como pouco criativo s\u00f3 porque a n\u00e3o conhece muitos detalhes dele. A criatividade se manifesta sob muitas formas diferentes. Em comum, todas recombinam informa\u00e7\u00f5es de maneira original para resolver um problema.<\/p>\n

Na minha opini\u00e3o, a criatividade depende muito mais do profissional do que da profiss\u00e3o. A gente encontra campanhas publicit\u00e1rias geniais e outras que poderiam ser tudo, menos criativas. Tamb\u00e9m v\u00ea t\u00e9cnicos encontrando solu\u00e7\u00f5es praticamente milagrosas e outros que parecem ser desprovidos de c\u00e9rebro.<\/p>\n

Criatividade n\u00e3o tem dono, nem curr\u00edculo, nem diploma, nem profiss\u00e3o. Ainda bem.<\/p>\n

L\u00edgia Fascioni | www.ligifascioni.com.br<\/a><\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

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