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A loja sem embalagem inaugurou em Berlim h\u00e1 quase um ano e desde o lan\u00e7amento do projeto, venho sendo marcada no Facebook todas as vezes que sai alguma not\u00edcia a respeito. A pedidos, fui obrigada a ir at\u00e9 l\u00e1.<\/p>\n

Bem, por algum motivo, vejo tantas coisas extraordin\u00e1rias nessa cidade, mas n\u00e3o sentia vontade de conhecer essa loja em especial. N\u00e3o sabia explicar por qu\u00ea. Ontem eu fui e entendi um pouco melhor.<\/p>\n

A ideia, que vem sendo vendida como inovadora e revolucion\u00e1ria, \u00e9 muito bacana, mas n\u00e3o considero nem inovadora e muito menos revolucion\u00e1ria. Primeiro porque j\u00e1 existem projetos semelhantes com o mesmo conceito em v\u00e1rios lugares do mundo. Comprar\u00a0produtos a granel \u00e9 uma pr\u00e1tica que conheci ainda crian\u00e7a, quando ia comprar feij\u00e3o ou arroz no armaz\u00e9m pr\u00f3ximo \u00e0 minha casa, ou mesmo amendoim japon\u00eas e\u00a0balas na barraca de doces perto da escola. O vendedor tinha uma esp\u00e9cie de caneca com al\u00e7a, que funcionava como medidor, ou ent\u00e3o usava uma balan\u00e7a mesmo. Se voc\u00ea quisesse, ele punha tudo num saco ou cone de papel, mas tamb\u00e9m podia colocar no pote que voc\u00ea levava de casa ou na sua lancheira; para ele, tanto fazia.<\/p>\n

Em Florian\u00f3polis havia uma loja muito mais inovadora, do meu ponto de vista (n\u00e3o sei se ainda existe, que acho o conceito ainda mais disruptivo): sabendo que a embalagem \u00e9 respons\u00e1vel por uma parcela important\u00edssima do pre\u00e7o de um perfume, voc\u00ea podia ir l\u00e1 e fazer o refil no seu pr\u00f3prio\u00a0vidro, pagando somente pelo volume de l\u00edquido.<\/p>\n

Mesmo aqui em Berlim, em qualquer quitanda que se v\u00e1 comprar legumes e verduras, voc\u00ea leva sua pr\u00f3pria sacola e n\u00e3o usa embalagem nenhuma. Os pr\u00f3prios supermercados n\u00e3o fornecem sacolas, voc\u00ea tem que compr\u00e1-las se quiser us\u00e1-las (acho que no Brasil tem alguns lugares que \u00e9 assim tamb\u00e9m).<\/p>\n

Nas lojas de artigos naturais no Brasil, que eu saiba, praticamente tudo \u00e9 vendido a granel nos mesmos moldes. Basta que o comprador leve sua embalagem se n\u00e3o quiser usar as do estabelecimento. Ou seja, depende muito mais do comportamento do consumidor do que da loja.<\/p>\n

Por tudo isso \u00e9 que n\u00e3o entendi o au\u00ea em torno da Original Unverpackung<\/a> em Berlim. A ideia \u00e9 bacana? \u00c9, sem d\u00favida! Tem o meu apoio? Mas \u00e9 claro, como poderia ser diferente? \u00c9 inovadora? N\u00e3o acho, sinceramente.<\/p>\n

Fisicamente, \u00e9 muito parecida com as dezenas de lojas de produtos naturais, regionais e veganos que j\u00e1 existem na cidade: simples, charmosa, bem organizada, despojada e com um atendimento especial.<\/p>\n

Os produtos est\u00e3o organizados exatamente da mesma maneira que a gente conhece de casas de produtos naturais no Brasil. Se voc\u00ea esqueceu de levar sua embalagem em casa, pode compr\u00e1-las na loja (como em qualquer outro lugar): h\u00e1 vidros, saquinhos de tecido e sacos de papel, pode escolher.<\/p>\n

Al\u00e9m das frutas e verduras, vi massas, gr\u00e3os diversos, biscoitos e produtos de higiene e limpeza (a\u00ed sim eu vi novidade). Tem tamb\u00e9m bastante coisa com embalagem, mas sempre de vidro (sucos, sopas, geleias e refrigerantes, por exemplo).<\/p>\n

J\u00e1 ministrei uma disciplina sobre embalagens no curso de design e posso dizer: a embalagem n\u00e3o \u00e9 apenas lixo dispens\u00e1vel. Ela muda a percep\u00e7\u00e3o em rela\u00e7\u00e3o ao produtos, traz informa\u00e7\u00f5es imprescind\u00edveis (conte\u00fado, validade, proced\u00eancia, entre outras coisa), protege e conserva os perec\u00edveis, entre outras fun\u00e7\u00f5es muito importantes. O problema n\u00e3o \u00e9 ter embalagem, mas o fato dela ser descart\u00e1vel. Se as empresas e as pessoas fizerem um esfor\u00e7o conjunto para gerar menos lixo (o que beneficiaria a todos), seria\u00a0s\u00f3 uma quest\u00e3o de projetar inv\u00f3lucros\u00a0que pudessem ser realmente reaproveitados. Nesse aspecto, lojas desse tipo que divulgam o conceito de menos lixo, ajudam muito a mudar a cultura do desperd\u00edcio.<\/p>\n

A quest\u00e3o \u00e9 que, apesar de ficar apenas a uns 2 km da minha casa, n\u00e3o senti vontade de ir at\u00e9 l\u00e1 fazer minhas compras, pois posso fazer a mesma coisa (exceto no caso de arroz, massas e produtos de higiene e limpeza) na quitanda ou no supermercado de produtos naturais e org\u00e2nicos que ficam a menos de uma quadra de onde moro.<\/p>\n

Os pre\u00e7os em geral tamb\u00e9m eram um pouco mais altos que a m\u00e9dia, al\u00e9m da variedade ser bem pequena (por exemplo, produtos de higiene, cosm\u00e9ticos e limpeza eram\u00a0s\u00f3 de uma marca). A quest\u00e3o da pouca variedade d\u00e1 para entender, mas os pre\u00e7os eu fico um pouco em d\u00favida.<\/p>\n

Parece que os moradores compartilham da minha percep\u00e7\u00e3o, pois a loja estava vazia e, enquanto estive l\u00e1, todas as pessoas entraram para saber sobre o projeto, mas ningu\u00e9m fez compras. Tem at\u00e9 um aviso na porta informando que eles n\u00e3o s\u00e3o um museu, ent\u00e3o pedem a colabora\u00e7\u00e3o de \u20ac 1 para quem quiser tirar fotos.<\/p>\n

Para mim, \u00e9 mais uma loja de produtos naturais\/regionais\/sustent\u00e1vel que soube fazer muito bem sua divulga\u00e7\u00e3o e a gest\u00e3o da marca. Mas a quitanda a alguns metros parecia estar vendendo bem mais, cada pessoa levando sua pr\u00f3pria sacolinha de casa. Pelo menos, foi a impress\u00e3o que tive…<\/p>\n

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