<\/p>\n

A f\u00edsica qu\u00e2ntica<\/strong> n\u00e3o \u00e9 mais aquela que estudei no curso de Engenharia. Hoje, ela est\u00e1 sofrendo do mesmo mal que o design: excesso de “especialistas” entre formadores de opini\u00e3o. E voc\u00ea, o que acha desse excesso de flexibilidade nos conceitos? Leia a minha coluna dessa semana no AcontecendoAqui<\/strong><\/a> e se atualize!<\/p>\n

FLEXIBILIDADE QU\u00c2NTICA<\/strong><\/p>\n

18-09-2007 <\/strong>Confesso que pouco sei de f\u00edsica qu\u00e2ntica. Na \u00e9poca em que estudava engenharia, cursei os quatro semestres de f\u00edsica t\u00e9orica, mas apenas o \u00faltimo era dedicado a essa desafiadora disciplina, pr\u00e9-requisito para quase todas as que vinham depois. A m\u00e9dia de reprova\u00e7\u00e3o era de 80%<\/strong>, e foram noites insones \u00e0s voltas com a constante de Planck, o Princ\u00edpio da Incerteza de Heisenberg, os complicados problemas com part\u00edculas e subpart\u00edculas at\u00f4micas. Apesar de fascinantes, os c\u00e1lculos de difra\u00e7\u00e3o de el\u00e9trons e n\u00edveis de energia eram trabalhosos. Sem d\u00favida, uma disciplina fant\u00e1stica e \u00fatil, pois \u00e9 nela que se baseia a teoria dos semicondutores<\/strong> que integram os chips de todos os aparelhos eletr\u00f4nicos que conhecemos<\/strong>.<\/p>\n

Falei tudo isso por causa da surpresa provocada pela declara\u00e7\u00e3o de uma conhecida socialite contando que ama f\u00edsica qu\u00e2ntica e que o conhecimento mudou a vida dela. Devo confessar que esse tipo de afirma\u00e7\u00e3o \u00e9 uma das coisas que mais me divertem em uma revista de celebridades (tamb\u00e9m curto muito as roupas!). Como assim? Ser\u00e1 que a vida dela mudou por causa da equa\u00e7\u00e3o de Schr\u00f6dinger?<\/strong> A erudita senhora declarava ainda que entendia tudo sobre o assunto, s\u00f3 n\u00e3o sabia como explic\u00e1-lo (Adorei! Por que n\u00e3o pensei em dizer isso nas provas?). Tamb\u00e9m afirmou com muita convic\u00e7\u00e3o que descobertas cient\u00edficas (???) apontaram que uma mudan\u00e7a no campo magn\u00e9tico da terra \u00e9 respons\u00e1vel pela guerra e a fome. Isso me lembrou de uma outra reportagem que dizia ser esta tamb\u00e9m a causa da redu\u00e7\u00e3o da dura\u00e7\u00e3o do dia de 24 para 16 horas (!!!). Bobagens a respeito de saltos qu\u00e2nticos e como eles podem curar doen\u00e7as ou encontrar objetos perdidos infestam indiscriminadamente a imprensa real e virtual.<\/p>\n

Essa tal de f\u00edsica qu\u00e2ntica inclusive j\u00e1 ocupa um lugar separado nas livrarias (bem longe dos livros de f\u00edsica e ao lado dos livros de auto-ajuda). \u00c9 confundida com filosofia de vida e citada com igual propriedade por m\u00fasicos, modelos, palestrantes motivacionais, publicit\u00e1rios, escritores, religiosos, cabeleireiros, artistas pl\u00e1sticos, massagistas, comentaristas esportivos, jogadores de futebol, apresentadores de televis\u00e3o, blogueiros diversos, terapeutas hol\u00edsticos, camel\u00f4s e empres\u00e1rios, sem distin\u00e7\u00e3o. As bobagens v\u00e3o desde \u201cpesquisas cient\u00edficas\u201d que descobriram que pensamentos negativos deslocam os el\u00e9trons de sua \u00f3rbita<\/strong>, at\u00e9 a formid\u00e1vel e milagrosa cura qu\u00e2ntica estelar tridimensional (??!!) que tem como princ\u00edpio a famosa equa\u00e7\u00e3o E=mc2 (Einstein deve estar se revirando no t\u00famulo). O f\u00edsico Leonard Mlodinow, parceiro liter\u00e1rio de Stephen Hawking resume: “Poucos realmente entenderam a obra de homens como Einstein ou Hawking. Mas os que pensam que entenderam s\u00e3o bem mais numerosos<\/em><\/strong>“.<\/p>\n

Pois \u00e9. Nesse ponto, a f\u00edsica qu\u00e2ntica se parece com o design<\/strong>. Poucos conhecem os conceitos fundamentais, dominam a semi\u00f3tica, compreendem as teorias da Gestalt aplicadas \u00e0 forma, entendem os princ\u00edpios da tipografia e estudam teoria das cores e t\u00e9cnicas de composi\u00e7\u00e3o. Mas todo mundo fala com a autoridade de quem sabe o que est\u00e1 dizendo. \u00c9 de doer\u2026<\/p>\n

Dia desses fui ao ortopedista (m\u00e1s not\u00edcias: descobri que a minha excelente flexibilidade \u00e9, na verdade, um defeito, resultado de um problema cong\u00eanito nos ligamentos) e resolvi ler uma revista enquanto esperava. Uma mat\u00e9ria sobre design me chamou aten\u00e7\u00e3o.<\/p>\n

Nunca tinha ouvido falar no tal famoso designer (o que n\u00e3o quer dizer nada) que come\u00e7ava o festival de barbaridades apresentando pinturas rupestres da caverna de Altamira como exemplos de design<\/strong> (!!!!!) e afirmando com convic\u00e7\u00e3o que todos temos um pouco de designers, pois gostamos de coisas belas<\/strong>. Era t\u00e3o ruim que tive que parar (fiquei enjoada). Tudo leva a crer que o g\u00eanio iria levar \u00e0 conclus\u00e3o que h\u00e1 design em tudo: no c\u00e9u, na lua, nos animais, nas plantas, nas estrelas\u2026. At\u00e9 mesmo na cabe\u00e7a dele!<\/p>\n

Antes de fechar a revista em estado de choque profundo, n\u00e3o pude deixar de ler a seguinte p\u00e9rola em lugar de destaque: \u201co design, hoje em dia, est\u00e1 muito comercial<\/strong>\u201d. Acho que deu para ter uma vaga id\u00e9ia do que um estudante de f\u00edsica sente ao ouvir coment\u00e1rios leigos sobre saltos qu\u00e2nticos.<\/p>\n

C\u00e9us, por que uma figura dessas ganha p\u00e1ginas duplas em revistas de circula\u00e7\u00e3o nacional? Custava ele dar pelo menos uma pesquisada r\u00e1pida no Google para saber que o design surgiu na \u00e9poca da Revolu\u00e7\u00e3o Industrial como uma forma de se conceber objetos j\u00e1 considerando a sua produ\u00e7\u00e3o em escala? Que design \u00e9 uma profiss\u00e3o voltada para a ind\u00fastria, para VENDER? Que o design \u00e9 comercial na sua pr\u00f3pria ess\u00eancia<\/strong>?<\/p>\n

\u00c9 desanimador. Tem horas que eu fico pensando se n\u00e3o seria melhor ter investido mais nos meus ligamentos frouxos para tentar uma vaguinha como contorcionista no Cirque du Soleil<\/em>\u2026<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

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