<\/p>\n

Talvez os n\u00fameros sejam a forma mais sensacional de demonstrar a intelig\u00eancia humana. Essa capacidade de abstrair a id\u00e9ia de quantidade, e mais, de manipular esse conceito e relacionar propor\u00e7\u00f5es, por si s\u00f3 j\u00e1 justificaria o kilo e pouco de c\u00e9rebro que a gente carrega sobre os ombros.<\/p>\n

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Todo mundo j\u00e1 aprendeu n\u00fameros romanos na escola, mas poucos se lembram por que usamos apenas os algarismos ar\u00e1bicos nos dias de hoje. \u00c9 simples: os hindus, os eg\u00edpcios e os babil\u00f4nios, ao contr\u00e1rio dos romanos, j\u00e1 usavam o m\u00e1gico n\u00famero zero<\/strong>. Ele torna poss\u00edvel opera\u00e7\u00f5es matem\u00e1ticas com n\u00fameros grandes usando o sistema posicional. Experimente fazer contas com mais de um d\u00edgito sem nosso amigo zero, usando apenas os n\u00fameros romanos. Simplesmente n\u00e3o d\u00e1!<\/p>\n

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Tem tamb\u00e9m o enigm\u00e1tico PI (\u220f)<\/strong>, aquele que aparece em todas as formas circulares do universo inteiro e que n\u00e3o pode ser descrito por uma fra\u00e7\u00e3o (o n\u00famero de casas depois da v\u00edrgula \u00e9 infinito, como todo n\u00famero irracional que se preze). O PI \u00e9 t\u00e3o antigo que n\u00e3o se sabe ao certo quem o descobriu, mas o nosso ancestral que come\u00e7ou a dividir a circunfer\u00eancia dos c\u00edrculos pelo seu di\u00e2metro deve ter ficado emocionado ao descobrir que dava o mesmo n\u00famero para qualquer que fosse o tamanho.<\/p>\n

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Uma das coisas mais fant\u00e1sticas que j\u00e1 li sobre o PI est\u00e1 no livro \u201cO \u00faltimo teorema de Fermat<\/em>\u201d, de Simon Singh. Ele conta que um ge\u00f3logo da Universidade de Cambridge resolveu dividir o comprimento real de um rio, considerando todas as curvas e meandros, pela linha reta calculada da nascente at\u00e9 a foz. Adivinha o que ele encontrou, para qualquer rio? Nosso querido PI<\/strong>! N\u00e3o \u00e9 fant\u00e1stico? Einstein sugere que o PI, nesse caso, \u00e9 o resultado da batalha entre a ordem e o caos.<\/p>\n

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E ainda tem o sensacional PHI (\u00de)<\/strong>, chamado de n\u00famero de ouro e respons\u00e1vel pela propor\u00e7\u00e3o \u00e1urea, ou divina. Ele aparece o tempo todo na natureza, seja na espiral logar\u00edtmica que se forma quando olhamos o rabo de um camale\u00e3o, no miolo de um girassol, seja num furac\u00e3o visto de cima e at\u00e9 nas formas da Via L\u00e1ctea. Aparece na distribui\u00e7\u00e3o das folhas de um galho, nas medidas dos desenhos de uma pena de pav\u00e3o e na asa de uma borboleta. Para o design, o n\u00famero PHI \u00e9 mesmo de ouro, pois ele indica quais s\u00e3o as propor\u00e7\u00f5es mais agrad\u00e1veis ao olho humano. Um livro muito bom para quem quer saber mais sobre essa j\u00f3ia \u00e9 \u201cRaz\u00e3o \u00e1urea: a hist\u00f3ria de fi, um n\u00famero surpreendente<\/em>\u201d, de Mario Livio.<\/p>\n

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Eis o ponto onde quero chegar: designers n\u00e3o s\u00e3o t\u00e3o amigos da matem\u00e1tica como deveriam. A rea\u00e7\u00e3o al\u00e9rgica a n\u00fameros \u00e9 aquela mesma que ataca a quase todos que n\u00e3o decidiram estudar as ci\u00eancias exatas.<\/p>\n

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Por que isso acontece? Bom, Pit\u00e1goras (aquele do teorema) nos d\u00e1 algumas pistas. Desde o in\u00edcio, ele foi perseguido porque pensava demais, e o que \u00e9 pior, perguntava demais. Desde suas primeiras descobertas matem\u00e1ticas, sacou que deveria manter segredo se quisesse continuar vivo. Chegou a se isolar numa caverna em uma parte remota de uma ilha grega para poder estudar sem ser perturbado. O cara, por\u00e9m, n\u00e3o gostava de ficar sozinho (voc\u00eas pensam que todo matem\u00e1tico \u00e9 chato?) e acabou pagando um menino para estudar com ele. Apesar do rapaz ser muito aplicado, Pit\u00e1goras achou que ter um aluno s\u00f3 limitava bastante suas pesquisas e queria mais gente para trocar id\u00e9ias. Foi no sul da It\u00e1lia que ele encontrou ambiente mais prop\u00edcio para criar uma irmandade que chegou a ter seiscentos seguidores (incluindo mulheres, com uma das quais ele chegou a se casar). A irmandade era uma esp\u00e9cie de religi\u00e3o, onde os n\u00fameros eram os deuses. E Pit\u00e1goras era t\u00e3o neur\u00f3tico com os segredos matem\u00e1ticos que os membros s\u00f3 eram admitidos se jurassem nunca revelar o que haviam descoberto. Reza a lenda que, depois da morte do Mestre, um dos alunos deu com a l\u00edngua nos dentes sobre o dodecaedro e acabou afogado. Eu, heim?<\/p>\n

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Bom, esse cuidado todo n\u00e3o salvou a pele de Pit\u00e1goras, pois a mais brilhante escola matem\u00e1tica do mundo foi cercada e incendiada com o Mestre dentro. Gra\u00e7as a alguns disc\u00edpulos que conseguiram escapar e se espalharam pelo mundo, formando outras escolas, hoje sabemos muita coisa sobre matem\u00e1tica devido a esse fant\u00e1stico louco de pedra.<\/p>\n

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As persegui\u00e7\u00f5es religiosas e pol\u00edticas que sempre existiram foram levando os cientistas a escreverem de maneira cada vez mais herm\u00e9tica. Lembram de Galileu, que caiu na besteira de traduzir em linguagem intelig\u00edvel o que tinha descoberto sobre as rela\u00e7\u00f5es entre a terra e o sol? Quase foi queimado pela inquisi\u00e7\u00e3o por essa ousadia de pensar (e calcular) demais. Se ele tivesse deixado tudo no c\u00f3digo cifrado da matem\u00e1tica, n\u00e3o teria sido t\u00e3o humilhado.<\/p>\n

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Tudo leva a crer que a matem\u00e1tica tornou-se antip\u00e1tica assim para se proteger, mas tamb\u00e9m acredito que parte da urtic\u00e1ria que assola designers, publicit\u00e1rios, escritores e professores de l\u00ednguas tamb\u00e9m se deva \u00e0 impressionante incompet\u00eancia de alguns professores da disciplina, que insistem em cobrar a parte chata e esconder as hist\u00f3rias mais legais (que talvez eles desconhe\u00e7am \u2013 falta de cultura geral \u00e9 uma doen\u00e7a das mais s\u00e9rias).<\/p>\n

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Ser\u00e1 que n\u00e3o est\u00e1 na hora de justamente os designers resgatarem essas maravilhas e a apresentarem de maneira mais palat\u00e1vel, amig\u00e1vel e simp\u00e1tica? Designers sabem como ningu\u00e9m traduzir o mundo de uma maneira sedutora e atraente, que os leigos entendem muito bem.<\/p>\n

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Tudo bem, talvez n\u00e3o precisassem chegar a tanto. Mas, pelo menos, usar com mais freq\u00fc\u00eancia a propor\u00e7\u00e3o \u00e1urea j\u00e1 seria um bom come\u00e7o<\/strong>.<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

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