O código da cultura

Para montar um time excepcional e fazer coisas realmente incríveis, você precisa de pessoas inteligentes, estudadas, experientes, criativas e também de um líder carismático, concorda? Eis aí o time dos sonhos. Para qualquer tarefa que seja, a equipe vai arrasar! 

Ou não? 

Na verdade, Daniel Coyle, no livro The Culture Code, diz que isso não garante nada. Aliás, cultura vem do latim cultus, que significa cuidado. E isso faz muita diferença, como vamos ver.

Estudos mostraram que você pode montar vários times dos sonhos, com executivos, MBAs, enfim, gente reconhecidamente competente, e eles vão perder para um time de jardim de infância em tarefas colaborativas como o desafio do mashmallow

No desafio do mashmallow você dá espaguetes crus, fita transparente, corda e um pedaço de mashmallow para cada grupo. Ganha o time que conseguir construir a estrutura mais alta e colocar o mashmallow em cima. 

Intrigado com o fato das crianças conseguirem montar estruturas quase três vezes mais altas que os grupos de executivos, engenheiros e advogados, Coyle resolveu investigar. 

O que ele conseguiu descobrir? Que crianças têm mais sucesso para realizar tarefas desafiadoras porque elas se sentem mais SEGURAS trabalhando em equipe. 

Ao contrário dos adultos, que debatem as ideias e escolhem as melhores estratégias, as crianças trabalham mais fisicamente perto umas das outras e quase não conversam; elas se comunicam por olhares. 

Os adultos e estudantes mais velhos quando trabalham em grupo estão sempre pensando: “quem é o líder nesse momento?”; “é ok criticar essa ideia?”; “que regras estão valendo aqui”? Gastam muito mais tempo administrando o status do que se concentrando no problema. 

Enfim, estão o tempo todo inseguros se continuarão ou não no grupo e se serão criticados pelo desempenho. 

As crianças são mais eficientes porque ainda não competem por status. Crianças não são mais inteligentes que os adultos; apenas trabalham juntas de maneira mais inteligente. Elas ainda possuem três habilidades que serão perdidas com o tempo: 

  1. Constroem segurança.
  2. Compartilham vulnerabilidades.
  3. Estabelecem propósito.

Daniel descobriu que há grupos de adultos que conseguem trabalhar assim, e são realmente brilhantes. Em comum, essas práticas: 

  • trabalham fisicamente próximos, geralmente em círculos;
  • trocam olhares o tempo todo;
  • gostam de contato físico (abraços, apertos de mão, toques); 
  • todos conversam com todos, sem hierarquia; muitas perguntas e poucas interrupções; escuta ativa e atenta;
  • humor e risadas; 
  • cortesias e gentilezas (abrir a porta, servir café, dizer obrigado, etc). 

Coyle dividiu o livro em três partes, para ajudar as pessoas a construírem esses times brilhantes, exatamente naqueles três pontos que as crianças se diferenciam.

1. Construir segurança

Para que alguém se sinta à vontade para colaborar com um grupo sem reservas, as perguntas (conscientes ou não) são: 

Nós estamos seguros aqui?
Qual o meu futuro com essas pessoas? Tem algum perigo à espreita? 

O que a pessoa quer saber é se ela está realmente segura ou se expor suas ideias pode oferecer algum risco (para a sua imagem, para seu psicológico, para seu status, etc). 

Assim, ao dar qualquer feedback, mesmo que negativo,  para um integrante de um grupo especial desses, é preciso deixar claro que:

  – a pessoa é parte do grupo

– o grupo é especial e tem um padrão muito alto

– todos acreditam que a pessoa é capaz de atingir esse padrão

Agindo assim, a mensagem clara é: vale a pena se arriscar e se esforçar trabalhando com esse grupo; eles vão me proteger, se for necessário.

Algumas ideias para implementar a sensação (real) de segurança na prática:

  • deixe sempre muito claro que você está ouvindo atentamente;
  • enfatize seus erros e falhas, especialmente se você é o líder;
  • acolha o mensageiro;
  • preveja desdobramentos futuros e compartilhe com o grupo;
  • nunca se canse de agradecer;
  • seja meticuloso e cuidados na hora de contratar;
  • elimine as maçãs podres;
  • crie espaços seguros, mas ricos em colisões;
  • assegure-se que todos tenham voz;
  • faça pequenas ações exemplares, como colocar o recolher o lixo;
  • acolha a diversão.

2. Compartilhar vulnerabilidade

Aqui o autor dá vários exemplos de empresas com casos práticos, inclusive com perguntas interessantes para quebrar o gelo numa entrevista e fazer com que a pessoa se sinta segura, mesmo que vulnerável.

Algumas ideias para compartilhar a vulnerabilidade no grupo:

  • Assegure-se que o líder se mostre genuinamente vulnerável. Algumas questões que ele pode compartilhar com o grupo:
    • Que tipo de coisa eu faço e você gostaria que eu continuasse fazendo?
    • Que coisas que não faço muito frequentemente, mas você gostaria que eu fizesse mais vezes?
    • O que eu poderia fazer para ajudar você a ser mais efetivo?
  • Nunca se canse de comunicar expectativas, para que todos entendam o que está sendo esperado.
  • Dê más notícias sempre pessoalmente.
  • Em conversações, resista à tentação de sempre adicionar valor.
  • Prefira a candura e evite a honestidade brutal.
  • Acolha o desconforto.
  • Alinhe a linguagem com a ação.
  • Faça o líder desaparecer ocasionalmente.

3. Estabelecer propósito

Novamente há histórias com exemplos de empresas, mas o resumo com ideias para colocar tudo em prática é a melhor parte.

  • Nomeie e ranqueie suas prioridades.
  • Seja dez vezes mais claro a respeito de suas prioridades do que você imagina que deveria ser.
  • Imagine onde seu grupo visa a proficiência e onde ele visa criatividade, lembrando que para ser proficiente, é necessário repetir os procedimentos sempre da mesma forma, ao contrário da abordagem criativa. É necessário dar suporte ao grupo nas duas maneiras, pois elas precisam coexistir.
  • Acolha o uso de frases de efeito (pode parecer bobagem, mas elas funcionam).
  • Meça o que realmente importa.

Olha, achei que as dicas podem ajudar bastante a desenvolver equipes onde as pessoas se sintam seguras o suficiente para investir seu esforço e, principalmente, a questão da gestão de expectativas aqui me parece muito bem resolvida (penso que esse é um dos maiores problemas para o desenvolvimento de um time).

Recomendo muito a leitura.

NOTA: Pesquisei e vi que no Brasil, eles traduziram o título para “Equipes brilhantes“.

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