Cada um, cada um

É janeiro e, entre outras coisas, isso quer dizer que vai começar mais um BBB. Tem também um outro reality bombando (um que mostra o dia-a-dia de mulheres ricas). E não se pode esquecer do sucesso imperdoável de um rapaz chamado Michel Teló (seja lá quem ele for, já devia saber que no Brasil fazer sucesso é crime).

Bom, não tenho TV e nem moro no Brasil. Como sei de tudo isso? É que minha timeline no Twitter e no Facebook está floodando de gente se rasgando por conta da diferença de gostos. Uns amam e outros abominam. Aparentemente, essas pessoas não conseguem coexistir no mesmo espaço virtual, a julgar pelas manifestações irritadíssimas de todos os lados. Estão rolando até propostas para fazer uma lei que impeça a exibição de reality shows no Brasil. Pode isso, Arnaldo?

O pior é que muitas dessas manifestações vêm de pessoas que vivem defendendo causas politicamente corretas. Mas regular o gosto alheio não seria o top do politicamente incorreto?

Os que se acham “mais esclarecidos” (adoro esse tom de superioridade cultural) advogam que reality shows e música sertaneja são alienantes e quem gosta disso só pode ser ignorante. Os “ignorantes” reclamam, com razão, o direito de gostarem do que quiserem. Certos eles.

Gente, qual o problema de gostar de BBB? E de Michel Teló? E de “Mulheres Ricas”? E de “A fazenda”? E de “Dr. Hollywood”? E namorar moços e moças? E postar fotos constrangedoramente sexies? E de assistir Hebe Camargo? E de não perder o Jô Soares? E de preferir não comer carne? E de só ouvir música clássica? E de fotografar cada prato que come e postar? E de defender animais? E de colecionar mensagens kitsch com lições de vida? A resposta é, reparem bem: NENHUM!

Cada um gosta do que escolhe e ninguém tem nada com isso. Detesta BBBs? Não assista! É contra o casamento gay? Não case com alguém do mesmo sexo. Acha que bicho morto não é para comer? Não coma. Considera Paulo Coelho o fundo do poço literário? Não leia. Simples assim. Mas deixe os que pensam diferente em paz.

O que não vale é querer que os outros tenham os mesmos gostos que você. O que faz a vida na terra ser tão divertida e interessante é justamente essas diferenças de perfis entre os viventes. Experimente viver num mundo padronizado e veja só que graça tem: zero.

Ahhh… eu não assisto, mas nas redes sociais só se fala disso, não dá para ficar de fora“, é a queixa que mais ouço (quer dizer, leio).

Gente, vou falar uma coisa. Não gosto de futebol. Acho chatíssimo. Mas seria bizarro eu sair por aí dizendo que as pessoas que gostam do esporte são toscas, bobas, feias, xexelentas ou fedidas. Tem dias que as redes sociais não falam em outra coisa (Imagina só na copa?…).

E aí? Vou gastar meu tempo xingando muito no twitter? Pra quê? Eu saio dali e vou fazer outra coisa, ora bolas. As pessoas se esquecem que tudo o que lêem, vêem, ouvem, comem e fazem está inteiramente sob o seu controle. Não quer fazer parte da discussão, é simples: não faça mesmo. Sem bicos e sem mágoas. Não gostou da vibe da festa? Volte outro dia.

Está irritado com o BBB ou com as ricaças? Aproveite para ler um livro, ouvir uma música, dançar, visitar uma exposição, namorar, desenhar, lavar louça, arrumar gavetas ou dormir. Sei lá. Mas não estrague o prazer dos outros.

Isso sim, é muito chato.

16 Responses

  1. Clotilde♥Fascioni
    Responder
    5 janeiro 2012 at 10:15 am

    Justamente o que eles querem é divergir para “ter o que fazer”, eu acho.Bjs♥

  2. 5 janeiro 2012 at 10:16 am

    Olá Lígia,
    Bom dia.

    Excelente artigo.
    Se uma pequena parcela da humanidade colocasse em prática o tal do “respeitar o limite dos outros”, certamente teríamos um mundo muito melhor. O que nos falta é por em prática a regra de ouro do comportamento interpessoal: trate os outros como gostaria de ser tratado.

    Esse seu artigo deveria ser afixado em salas de espera de consultórios, laboratórios, salas comerciais etc. É muito bom. Usual.

    Felicidades.

    Rodnei
    Criciúma/SC

  3. Daniela Carette
    Responder
    5 janeiro 2012 at 10:53 am

    Concordo com absolutamente tudo que você disse Ligia. Pena que seja tao dificil pras pessoas respeitarem o espaço alheio.
    Beijos

  4. 5 janeiro 2012 at 1:44 pm

    Gostei de tudo, especialmente do “lavar louça”. Esse povo precisa de TER-A-PIA. Ter a pia cheia de louça para lavar … hehehehe

    Auf Wiedersehen!

    • ligiafascioni
      Responder
      5 janeiro 2012 at 5:01 pm

      Aahahahah…

  5. Julio Verani
    Responder
    5 janeiro 2012 at 3:26 pm

    Oi Lígia,

    Sou defensor do aumento da qualidade de informações na mídia brasileira (nem de longe radical mas a favor da idéia.

    Adorei a idéia do “Aproveite para ler um livro, ouvir uma música, dançar, visitar uma exposição, namorar, desenhar, lavar louça, arrumar gavetas ou dormir.”

    Seguindo esta dica, enquanto alguns recolhem os horizontes outros buscam mais informação de qualidade ( coisa que a mídia brasileira parece não conhecer).

    Excelente artigo.

    Grande beijo!

    • ligiafascioni
      Responder
      5 janeiro 2012 at 5:01 pm

      Que saudades, Julio! Beijão 🙂

  6. samuel goes
    Responder
    12 janeiro 2012 at 11:42 pm

    Lígia. Sinceramente e com respeito ao seu texto bem escrito e visivelmente bem intencionado, discordo totalmente do que você argumenta, ao que eu chamo de espontaneismo cultural insipiente. É justamente por conta desse discurso do “tudo pode” (pode gostar de bbb, pode ouvir michel teló (?), pode dançar na boquinha da garrafa, pode fazer filme pornô, cada um faz o que que quer, que a cultura brasileira, pra falar só dela, se atola cada dia mais na lama visçosa da mediocridade. Eu digo que não pode pra um monte de coisas. O vírus da baixa cultura é sorrateiro e tem uma força manipuladora mais forte do que pensamos. Pode parecer apenas um gesto fútil ou sem intenção, ingênuo ouvir esse tal Michel teló, mas na verdade a força com que isso ecoa e alcança todas as classes sociais é esmagadora e fascista. Uma criança que escuta Michel Teló, por influência dos pais, será muito mais facilmente atraída por essa bosta do que se escutasse música clássica, por exemplo. Isso acontece porque a arte, a boa arte, o espírito diletante não se propaga com a mesma intensidade do que o gosto pela baixa cultura, pelo que é fácil, pelo que não tem critério e só serve pra entreter, sem fazer refletir. As pessoas não optam pelo lixo cultural por opção pessoal; este gosto é condicionado justamente porque todo mundo ouve, porque todo mundo aceita como normal, como mais uma manifestação artística brasileira. Não! Funk não é música, sertanejo só serve pra alienar às pessoas, para que elas fujam de seus próprios problemas, para que não pensem nada além de saber tirar o pé do chão, ou de achar o amor lindo. Se começarmos a dizer não a essas pequenas coisas, que são gigantes instrumentos de manipulação das massas, tornando-as mais incapazes, menos reflexivas, mais ignorantes, menos formadoras de opinião, chegando ao ponto de dizer: a deixa a minha filha escutar isso..que que tem de mal? Pra não me alongar, cito o cérebre texto de Maiakovski…” Na primeira noite, eles se aproximam e colhem uma flor de nosso jardim.
    E não dizemos nada.
    Na segunda noite, já não se escondem, pisam as flores, matam nosso cão.
    E não dizemos nada.
    Até que um dia, o mais frágil deles, entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a lua, e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta.
    E porque não dissemos nada, já não podemos dizer nada.

    – Maiakovski, poeta Russo.

    • ligiafascioni
      Responder
      13 janeiro 2012 at 10:23 am

      Oi, Samuel!

      Conheço bem o verso de Maiakovski, mas não se esqueça de que ele falava sobre o totalitarismo. Tenho medo de decidir o que é bom para os outros, o que é certo, o que é melhor. Posso decidir o que é melhor para mim e para meus filhos (se os tivesse). Concordo que, se eu tivesse uma filha, jamais deixaria a menina (ou menino) ficar dançando créu – mas nossos filhos são nossa responsabilidade; as demais pessoas não são e têm o direito de pensar diferente.

      Sinceramente, entendo seu ponto de vista, mas um regime totalitário, bem como Maiakovski temia, começa exatamente assim: decidindo o que é melhor para todos baseado apenas no que você acha que é certo, belo e bom.

      Prefiro cuidar da minha vida e das minhas responsabilidades (você não vai me ver discutindo BBB na minha timeline ou ouvindo Funk); mas acho fundamental respeitar os que pensam diferente (inclusive você, que pensa diferente de mim…eheheh).

      Penso que a gente tem que fazer a nossa parte que é um trabalho de convencimento e de mostrar que outras coisas são interessantes também, mas jamais pela imposição.

      Um grande abraço e obrigada por acrescentar tanto à discussão!

  7. samuel goes
    Responder
    19 janeiro 2012 at 7:35 pm

    OI, querida Lígia…eu falava justamente do totalitarismo da baixa cultura…só que, como a baixa cultura parece burra e despretensiosa, o discurso totalitário será o meu e de outras poucas pessoas ( ditas pensantes, pseudo-intelectuais ou ainda recalcadas) que dirão não, quando o fascismo, desta vez, está no sim, ou mesmo no: não faz diferença.Como, por total incapacidade de reflexão, os que apoiam a cultura imbecilizante de massas não poderão criticar o lado oposto, fica parecendo que os cri-cris, invejosos ou até mesmo ditadores, somos nós que ainda conseguimos pensar. Mas não se engane, o totalitarismo deles é silencioso, porque parece sempre fragilizado e melindroso. Parece que eles não nos tiram nada. É que eles são os atacados, né? De todo modo, respeito seu ponto de vista e sei que, no fundo, você não perpetua esse tipo de cultura de massa que para nada serve. Beijos e obrigado por postar meu comentário!

  8. samuel goes
    Responder
    19 janeiro 2012 at 7:49 pm

    tinha mais uma coisinha…quando decido que uma coisa é ruim para os outros é justamente porque tenho que pensar por eles que faço isso…ou você acha mesmo que alguém que escolhe funk à música clássica está pensando, ou que essa escolha foi resultado de alguma reflexão…só escolhe porque disseram pra ele que funk é bom! Seu argumento de que você tem medo de dizer o que é certo ou bom para outros põe por terra por exemplo toda a história da crítica cultural de nosso paísl ( cada vez mais inexistente) de que Chico Buarque é o que temos de melhor na música. E aí, estivemos sob efeito de um poder totalitário este tempo todo?

    • ligiafascioni
      Responder
      20 janeiro 2012 at 12:57 pm

      Oi, Samuel!
      Essa é uma questão complexa e está faltando uma cerveja para completar a linha de racicíonio (ahahaah…. mentira, só tomo vinho). Há muita discussão sobre o assunto e as conclusões são as mais distintas. Quando eu decido o que é melhor para o outro, significa que sou superior a ele – eu sei e ele não. Não me sinto à vontade com isso, até porque não acredito nessa afirmação. Muita coisa a gente não gosta porque não conhece. Muita coisa que hoje é considerada cultura (jazz e blues, por exemplo), já foi considerada errada e de baixo nível em outros tempos.

      Ao mesmo tempo que a internet está cheia de lixo, nunca pude ter tantos e variados contatos com gente que pensa e tem a acrescentar. Os textos estão cada vez melhores e mais interessantes (é só procurar direito). Não concordo que isso seja um poder totalitário – o que impede uma pessoa de assistir BBB e estudar filosofia, por exemplo? Ou gostar de pagode e ópera? Acho que o ser humano é mais complexo que isso, e toda vez que se resolveu simplificar a coisa, não deu certo.

      Continuo acreditando que, mais eficiente e justo do que decidir o que é certo para o outro, é mostrar a ele (de uma forma interessante) que existe coisa diferente que tanbém é boa. Se eu ficar com esse discurso sobre o que presta e o que não presta, nunca vou ser lida por uma funkeira ou uma mulher-fruta, por exemplo. Mas se eu me tornar interessante o suficiente, pode ser que ela venha conversar e ouvir o que tenho a dizer. E melhor, pode ser que eu consiga ver o mundo do ponto de vista dela; todo mundo cresce e fica mais rico assim (eu acho). Se eu conseguir falar coisas interessantes sem julgar os gostos alheios, talvez eles me dêem uma chance de me ler.

      Discursos sobre o que é bom e o que é ruim são como muros; afastam e hirarquizam as pessoas. Não tem mérito em gostar de música clássica se isso foi tudo o que se ouviu na vida (assim como o funk). Penso que o melhor é ouvir tudo, para depois escolher o que toca seu coração.

      Se a gente impõe o certo, limita o mundo e as pessoas. Acho injusto. Mas claro, isso é só meu ponto de vista…

      • ligiafascioni
        20 janeiro 2012 at 1:03 pm

        Ah, mais uma coisinha: totalitarismo é quando você impõe gostos, valores e ideias a um povo. Eu e você temos a liberdade de discutir livremente, além de ter gostos e ideias diferentes do que “o poder totalitário da baixa cultura” sem sermos minimamente incomodados por isso. Não vejo ninguém da “baixa cultura” atacando jazz, blues ou música clássica. Não vejo ninguém que assiste BBB criticando alguém porque estuda matemática. Não consigo ver esse totalitarismo que você aponta.

        O que existe é que as opções culturais para a maioria das pessoas são mais limitadas; elas escolhem daquilo que têm acesso. Em vez de decidir o que é melhor para elas, penso que seria mais justo apenas apresentarmos mais opções. Eu tento fazer a minha parte de formiguinha…. 🙂

      • Samuel Arlindo Góes
        1 novembro 2012 at 3:46 pm

        hauiayauiyauiaa…desculpa, só agora li tua resposta…adoreiii

        kkkkkkkkkkkkk

        cxervejinha, heim? que tal?

      • Mara Luiza Mattos
        29 julho 2015 at 1:07 am

        A sua lucidez me comove. Fico realmente encantada quando percebo em uma pessoa uma imensidão de olhares, pensamentos e complexidades (entendidas e trabalhadas). Parabéns! Ganhou mais uma fã.

  9. Fátima Simãozinho
    Responder
    14 fevereiro 2012 at 3:03 pm

    Achei ótimo o seu texto!!! Muito bem escrito!! Parabéns!!

    E viva o livre arbítrio!!!!

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