Propaganda mal-educada

propaganda mal-educada

Dia de frio, vento e chuva em Florianópolis. Entro no carro apressada, luto para fechar a sombrinha sem furar meus olhos, coloco o cinto, dou a partida e só não solto um palavrão daqueles que vêm com asterisco porque sou uma mulher muito fina. Não é que alguém contratado pelas lojas Millium prendeu um jornalzinho de ofertas bem no meu limpador de pára-brisas? E, supremo requinte, do lado do passageiro, para dificultar ainda mais a operação de retirada.

A loja até que tem bastante coisa útil, mas agora resolvi boicotá-la, só de raiva. E fico aqui me perguntando se eles esperavam outro efeito, fazendo propaganda dessa maneira. É claro que alguém é capaz de dizer que os gestores não têm controle sobre onde os distribuidores de panfletos colocam os papéis. Pois deveriam. A marca deles está lá, e o dinheiro está sendo gasto para denegrir a sua imagem, causar antipatia, colocar em risco motoristas desacompanhadas e sujar a cidade, entre outros efeitos menos nobres.

Os espalhadores de folhetos usam expedientes inacreditáveis para atingir suas metas. Já aconteceu de eu sair andando com o carro e, ao olhar pelo espelho lateral direito em um cruzamento, descobrir que ele está completamente tapado por um anúncio de salão de beleza caprichosamente colado com durex. Esse tipo de crime deveria estar previsto no código de trânsito; propaganda sem noção deve causar mais acidentes que celulares, bebidas alcoólicas e pessoas de boné juntas, podem acreditar.

Campanhas publicitárias deveriam ser usadas para tornar a marca simpática, provocar desejos, atrair a atenção; jamais para causar crises de descontrole verbal em pessoas normalmente cordatas. Mas o que os anunciantes querem que as pessoas sintam quando entram em um site para ler uma notícia e aparece bem na cara delas um saltitante e antipático banner animado que tapa o texto todo?

Além de pragas clássicas da vida moderna, como os spams que atulham a nossa caixa de correio, agora é moda entre as farmácias colocar um jornalzinho de ofertas na sua sacola de compras. Mais lixo que eu não pedi para levar para casa. A Veja, que eu assino, traz tantos papéis encartados no saco plástico que eles devem pesar quase o mesmo que a revista. Para mim, essa papelada é o equivalente em chateação ao telemarketing ativo, com o agravante que derruba árvores (também desconfio que deve custar mais caro).

Não, ao contrário do que possa parecer, não estou de TPM e não odeio propagandas. Pelo contrário, eu as adoro! Mas acredito que gentileza e boa educação são fundamentais para ganhar a simpatia de alguém. Há inúmeras maneiras inteligentes e criativas de promover a marca sem infernizar a vida alheia.

Existe um princípio básico de sedução, que de tão elementar, as empresas acabam se esquecendo: funciona muito mais mostrar-se tentador a quem realmente interessa do que se oferecer constrangedoramente a qualquer um que passa. De tão óbvio, chega a arder os olhos. Gente, então por que essa overdose de anúncios “facinhos”?

Vejam só: quem é que não adora receber amostras, por exemplo? As pessoas fazem fila para ganhar qualquer coisa. Dificilmente a moça que as distribui terá que passar pelo mico do pessoal dos folhetos, que fica importunando os passantes para lhes impingir uma coisa que eles não querem. Dá para oferecer bônus de descontos, cupons para sorteios, brindes criativos, um monte de coisas do bem. E note-se que o verbo é oferecer, não empurrar.

A empresa quer que o internauta visite seu site? Não precisa agredi-lo esfregando sua propaganda na cara dele. Basta criar uma promoção ou concurso cultural com prêmios legais – ele vai lhe dar a ficha completa de bom grado. Fazer convênios com fornecedores que sejam vantajosos para seus clientes também ajuda. Enfim, opções não faltam para quem quer realmente seduzir.

Ah, por obséquio, só não coloquem papeizinhos no meu carro, sim?

Lígia Fascioni | www.ligiafascioni.com.br

3 Responses

  1. 9 julho 2008 at 6:00 pm

    Ah, também detesto esses papéis no pára-brisa! E aconteceu comigo esses dias de colocarem um que, pela cor e formato, parecia uma multa de trânsito. Vinha andando pela calçada e de longe já vi. Me chateei muito! Fui pensando: Droga! Estacionei em local proibido! Imaginando o quanto isso ia me custar, andei resmungando. Quando cheguei, vi que era coisa de gente inconveniente. Pensei em ligar pra loja só pra reclamar dos minutos de estresse que tive! rs

  2. Marciane Faes
    Responder
    13 janeiro 2015 at 9:03 am

    Logística reversa dos folhetos de propaganda na caixa de correio: eram mais de 20 de uma mesma empresa, literalmente desovados pelos entregadores. Meu pai visitou o estabelecimento, devolvendo-lhes o material para que fosse reaproveitado, o que agradeceram.

    • ligiafascioni
      Responder
      18 janeiro 2015 at 1:39 pm

      Que ótima ideia 🙂

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