A menina com todos os dons

Descobri o quarto sebo em Berlim especializado em livros em inglês; para estreá-lo, levei “The Girls with all the Gifts” (tradução livre: “A menina com todos os dons”), de M. R. Carey.

Não vou enganar ninguém; comprei porque gostei do nome, da capa e confesso que fui influenciada pelas frases elogiosas impressas em todos os lugares. 

Aí comecei a ler e me dei conta; não acredito! Caí numa história de zumbis, que detesto! Porém, uma história tão boa e bem escrita que não consegui largar até a página 460, quando acaba.

Nunca tinha ouvido falar do autor, mas esse britânico escreve ficção e quadrinhos (inclusos X-Men e o Quarteto Fantástico), além de roteiros para cinema; inclusive, esse livro virou filme em 2016 com a atriz Glenn Close como Dra. Caldwell (é claro que não assisti, pra variar…rsrs). Então, quem preferir, já pode ir direto para o filme (por sua própria conta e risco, pois não sei como ficou).

Mas vamos à história, que se passa na Grã Bretanha.

Melanie é a protagonista e tem 10 anos de idade. Ela vive sozinha num quarto e só sai para assistir aulas, no fim do corredor. Ela não se lembra de onde veio e não sabe quem são seus pais, assim como seus outros 19 colegas de classe. 

Ela já está acostumada ao guarda fortemente armado que a amarra numa cadeira de rodas e coloca uma focinheira na menina para transportá-la até a sala de aula todos os dias. Depois da última criança chegar, eles podem desamarrar uma das mãos para escrever.

As aulas são de história, ciências, matemática, geografia, literatura e poesia; tudo o que uma criança dessa idade normalmente aprende numa boa escola. 

Inclusive foi numa aula com a professora Helen Justineau (sua favorita) que ela conheceu a história de Pandora, criada por Hefesto e Atena, e recebeu uma qualidade de cada um dos deuses sob as ordens de Zeus. Por isso o nome Pandora significa “aquela que possui todos os dons”. Mais tarde, por causa da caixa que continha todos os males do mundo e que foi aberta por curiosidade, Pandora passou a significar aquela que traz problemas. Mas Pandora também soltou a esperança, que estava na mesma caixa. E esse mito tem muito a ver com a história desse romance e se encaixa muito bem como nome para esse livro.

Mas voltando à história de Melanie, a gente vai acompanhando e começando a entender porque ela está presa e vive amarrada. É que aconteceu uma coisa muito tensa: o mundo foi contaminado por um fungo e os seres humanos se transformaram em zumbis caçadores de carne. Quando a pandemia começou foi o caos: cidades tentaram se isolar, teve toque de recolher, tentativa de isolamento químico, aspirantes a ditadores aproveitaram para tomar o poder, forças armadas se organizaram, tudo muito perigoso e complicado. No final, Londres acaba como uma cidade fantasma e Beacon, um local menor, acaba sendo a base dos sobreviventes.

A rotina de Melanie e seus colegas é tediosa e a menina, uma superdotada, sente muita falta de aprender mais. De vez em quando, um dos colegas de aula some e nunca mais reaparece. Ninguém parece se importar em dar explicações para essas crianças.

Eles estão num centro de pesquisa isolado no interior do país e protegidos por um batalhão de forças especiais. Isso é necessário porque a qualquer momento podem ser invadidos pelos Famintos, como são chamados os zumbis que se alimentam de carne humana.

Eis que Melanie é levada para o laboratório da temida Dra. Caroline Caldwell, a cientista chefe do lugar. Ao chegar lá, ela se dá conta que vai ter seu cérebro fatiado para estudos, e sem anestesia, pois a Dra. Caldwell não considera Melanie um ser humano (depois ela vai entender o porquê). 

Ela é salva no último minuto pela professora Justineau (que é cientista também, porém, psicóloga) e por uma invasão de Famintos no centro de pesquisa. 

Entre ataques, confusão e muitas cenas fortes, Melanie descobre que o cheiro dos seres humanos (incluindo o de sua professora) lhe abre um apetite quase incontrolável, que ela não consegue entender.

No final, Dra. Caldwell, Profa. Justineau, Melanie e dois agentes de segurança conseguem fugir. Mas agora estão fora dos muros e têm que sobreviver juntos aos Famintos. Desnecessário dizer, a essa altura, que Melanie descobre que é um deles, porém, diferentes, pois ela pensa, sente e é inteligente (até então, todos os Famintos que encontraram eram literalmente zumbis).

E é por isso que essas crianças estavam no centro; porque Dra. Caldwell queria estudá-los para encontrar a cura. O segurança senior, Sargento Parkes, não quer levar Melanie na empreitada por medo de ser devorado (ele era quem amarrava a menina todas as manhãs). O soldado mais novo está apenas curioso.

A história tem várias e ótimas reviravoltas, e, mesmo sendo de zumbis, vale demais pelo entretenimento e pelo amor que se estabelece entre professora e aluna (são quase mãe e filha), semelhante, porém num grau mais raso, do sentimento entre o soldado e o sargento.

A história é cativante, muito bem escrita e eu não consegui largar até terminar. Também fica a se pensar no que é importante quando o mundo entra em colapso e dinheiro, poder, aparências, propriedades, nada faz mais sentido e nem tem importância. Os que sobraram só têm uns aos outros e a esperança de que as coisas melhorem.

Gostei demais e recomendo, mas fui olhar agora e a versão em português ficou “A menina que tinha dons“; não entendi — porque tiraram alguns dons dela? A menina tinha todos, agora tem alguns… tadinha…

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