Minha amiga genial

Fazia muito tempo que eu queria ler Elena Ferrante; só ouvi a falar bem das obras dela. Esse livro, especificamente, “Meine geniale Freundin“, mereceu até um filme e uma série na Netflix. Pois não é que encontrei o danado em edição capa dura num sebo por € 4,00?

Bem, o romance começa com a narradora, Elena, recebendo um telefonema de um homem desesperado procurando sua mãe, que sumiu sem deixar nenhuma pista. Elena é amiga de infância da desaparecida; ambas estão com 66 anos quando a história é contada. A narradora não se surpreende com o sumiço (há anos a amiga dizia que queria retirar-se do mundo sem deixar pistas) e decide escrever sobre a amizade das duas.

Moravam no mesmo bairro pobre nos arredores de Nápoles, Itália. Pela descrição, parece um cortiço, com casas muito próximas, violência gratuita, pobreza e gritaria. As duas passam por aventuras e são as melhores alunas na escola.

Lila, a amiga desaparecida, é filha de um sapateiro e é de uma inteligência absurda. Sua família bate o recorde de empréstimos da biblioteca da escola; Lila é capaz de raciocínios brilhantes e discussões profundas sobre assuntos diversos. Mas a permanência das duas na escola está sempre ameaçada pelas respectivas famílias; são mulheres, para que estudar? Mesmo a maior parte dos meninos não tinham essa oportunidade, pois precisavam trabalhar logo para ajudar em casa e ajudar a sustentar as numerosas proles.

Elena passa por crises diversas, mas persevera, com decisivo incentivo e apoio (inclusive financeiro) dos professores. Lila acaba desistindo dos estudos e vai trabalhar na sapataria do pai.

A dor que Elena sente também é a minha. Lila para de ler, não quer aprender mais nada e se torna uma moça linda e cobiçada. Como uma pessoa tão brilhante e inteligente pode se contentar em se casar aos 16 anos e pensar em mais nada a não ser em ter um marido e gerar uma numerosa prole?

A história se desdobra entre as diversas famílias do lugar, seus dramas, toda a questão da máfia, os resquícios do fascismo e da segunda guerra (a narração inicia na década de 50 do século passado), as descobertas das adolescentes, as inseguranças, os riscos, enfim.

O final é daqueles que pode gerar horas de debates, discussões e interpretações.

A hoje consagradíssima escritora, publicou anonimamente “Minha amiga genial” como seu primeiro romance; não consegui descobrir se é autobiográfico, mas pelo menos em parte, deve ser.

Fico feliz por Elena. Mas fico triste pelas milhares de Lilas frustadas e desperdiçadas que ainda existem pelo mundo…

Recomendo muito.

NOTA: Li a versão em alemão, mas já vi que tem nas livrarias brasileiras.

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