O hábito de colaborar

Resolvi comprar esse livro porque tinha gostado muito do The Creative Habit, da mesma autora. Então, The Collaborative Habit: Life Lessons for Working Together (tradução livre: “O hábito de colaborar: lições de vida sobre trabalhar juntos“), da Twyla Tharp, era uma sequência natural a ser seguida, né?

Para quem não viu o primeiro livro, o link da resenha está aqui.

Na verdade, mais do que uma sequência natural, a razão é porque cada vez mais me dou mais conta de que colaboração é a coisa mais importante que um ser humano pode aprender.

Tem um outro livro, um dos melhores que já li na vida, que se chama “A ilusão do conhecimento” (link para a resenha aqui), que corrobora a ideia de que a inteligência individual é superestimada; a capacidade de colaborar é muito mais importante.

Twyla não usa o termo líder diretamente, mas é, na verdade, exatamente o que ela faz, já que não existe colaboração sem liderança.

Mas primeiro vamos apresentar essa mulher maravilhosa e seu contexto, se você ainda não leu ou viu a resenha do livro anterior dela. 

Twyla é uma das maiores coreógrafas americanas da história: é dela a sensacional coreografia onde o bailarino russo Mikhail Baryshnikov dança com o mestre do sapateado americano Gregory Hines no inesquecível filme “O sol da meia-noite”; foi ela quem desenhou todas as danças do antológico musical “Hair”, de Milos Forman. Mais tarde ela trabalhou com esse mesmo diretor no filme “Amadeus”. Ela também fez numerosos trabalhos para o teatro, colaborando com músicos como Bob Dylan, Abbot Costello e Billy Joel. Enfim, se tem uma pessoa que entende de construir coletivamente, é ela.

Twyla é uma líder, mas define-se como uma colaboradora profissional (o que não está errado, já que líderes também colaboram). 

Eu gosto de usar a definição que diz que líder é alguém que precisa de ajuda para realizar algo. Claro, pois se ele pode fazer sozinho, não é um líder, é um executor. Vai lá e faz. Quando a coisa é maior ou mais complexa do que uma pessoa só pode dar conta, ela precisa de colaboradores para ajudar. 

E é isso que Twyla faz: ela não consegue dançar sozinha um espetáculo que precisa de dezenas de bailarinos, músicos, assistentes, iluminadores, produtores, figurinistas e mais um monte de profissionais. Então ela busca ajuda. E faz acontecer.

Nesse livro, ela dá algumas dicas que funcionaram para ela e usa como exemplo sua própria vida profissional para mostrar como chegou às conclusões que compartilha. 

PORQUE COLABORAR É IMPORTANTE

Na primeira parte ela explica porque a colaboração é tão importante, reforçando os argumentos dos autores que já citei acima. Mas ela chama atenção para um fato que até então eu não tinha me dado conta.

Apesar da colaboração ter nos trazido até aqui, a maioria de nós cresceu num ambiente onde apenas as conquistas individuais eram celebradas. Não sei vocês, mas eu cresci num ambiente escolar bem competitivo, onde notas individuais eram muito mais importantes do que trabalhos em equipe. As pessoas celebram empresários, cientistas, artistas e políticos como se as realizações deles fossem individuais e resultado de seu próprio talento, e não o resultado de um trabalho de equipe.

Agora, parece que as coisas estão começando a mudar (pois o povo se deu conta de que nesse modelo a maioria que colabora não consegue colher os frutos de seu trabalho e apenas uns poucos ficam com os louros — e lucros).

A palavra da vez é colaboração. E as pessoas precisam aprender como fazer isso, depois de tanto tempo competindo.

Twyla diz que você não pode forçar as pessoas a colaborarem. Você pode compartilhar o escritório ou estúdio, pode ser um colega num comitê ou num conselho, pode estar na mesma equipe — mas se o coração não está junto, o processo é como uma concha seca e não floresce, não frutifica. É uma participação puramente burocrática. 

Segundo ela (no que concordo totalmente), colaboradores não nascem; eles são construídos e educados, um dia de cada vez, através da prática, da atenção, da disciplina, da paixão, do comprometimento e, principalmente, do HÁBITO. Ao mesmo tempo, fomos cunhados para colaborar, como se fosse uma segunda natureza que precisa ser despertada.

Outra coisa que amei foi essa definição: colaboração é o reconhecimento que existe mais vida, oportunidades, conhecimento e perigos do que nós podemos dar conta sozinhos.

Twyla fala também sobre gestão de expectativas: a melhor colaboração acontece quando cada um sabe o que é esperado dele. E, mais do que isso, qualquer pessoa inteligente aprende mais pelo exemplo do que por qualquer outro método. Então, o líder tem que ser o exemplo do que ele espera de cada um, seja gentileza, comprometimento ou respeito.

INSTITUIÇÕES

Ela fala também da dificuldade que é colaborar com uma instituição ou empresa, em vez de uma pessoa física. Antes de começar qualquer projeto, a coreógrafa começa fazendo uma lista de todos os recursos que ela precisa para assegurar que a instituição terá capacidade de provê-los, por exemplo (é a tal gestão de expectativas aplicada em uma escala maior). É preciso que tudo seja previsto e documentado, que se saiba e conheça bem a pessoa que irá representar a instituição nas comunicações.

Outra coisa a se ter em mente é que instituições, por mais abertas que pareçam, têm como missão intrínseca preservar sua sobrevivência; e para isso ela vai defender seu status quo o quanto puder, defendendo-a de estranhos com desafios e ideias muito diferentes. Então, a comunicação aqui é essencial, mais do que em qualquer outra situação.

AMIGOS COLABORADORES?

E a colaboração entre amigos para um projeto? Essa é uma grande questão para Twyla, que sempre evita trabalhar com bons amigos, mas acaba, não raro, fazendo bons amigos através de colaborações. 

Mas há que se tomar cuidado, pois, como ela mesma diz, o bom colaborador é mais fácil de achar do que um bom amigo. Na verdade, achar um amigo de verdade está no topo da hierarquia de coisas difíceis; então, o melhor a fazer é proteger essa relação tão rara. Trabalhar juntos pode colocar isso em risco.

MILOS FORMAN

Twyla apresenta uma série de lições que aprendeu com o diretor de Hair e de Amadeus:

  1. Jamais gritar. Jamais.
  2. Se você está a ponto de gritar, afaste-se e vá dormir (no caso dele) ou se exercitar (no caso dela). 
  3. A comunicação clara, precisa e sem margem para dubiedades faz toda a diferença.
  4. Os colaboradores precisam de atenção; tocar suavemente as pessoas para aumentar a conexão pode mostrar que você realmente se importa com o que ela está sentindo.
  5. Ouvir sugestões de todos os envolvidos melhora muito o espírito do grupo.
  6. Falar “muito obrigada”nunca é demais. Repita a cada oportunidade, a cada pequeno gesto, até se acostumar a fala isso dezenas de vezes por dia. 

CONCLUSÃO

Twyla ainda fala sobre colaboradores difíceis, que desafiam o trabalho e tornam as coisas mais complicadas e também sobre a colaboração remota (às vezes não tem outro jeito). 

Essa líder inspiradora escreveu um livro inteiro sobre liderança sem nunca usar essa palavra e sempre enfatizando a colaboração: realmente ela entendeu o espírito da coisa mais do que qualquer líder que eu conheça.

E para fechar, essa frase que diz tudo: “Toda colaboração é uma história de amor”.

E é mesmo. 

A parte triste é que nenhum livro dessa maravilhosa foi traduzido para o português (se você precisava de motivação para estudar inglês, olha aqui!!). Uma preciosidade dessas não pode ficar de fora da sua estante.

Se você quer/pode ler no original, é só clicar nesse link da Amazon do Brasil

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