Bolsa de valores

Estava ontem sentada num café esperando meus companheiros de reunião chegarem e acabei ouvindo um pedaço de conversa entre duas moças sentadas na mesa do lado. Uma parecia muito indignada, pois tinha saído de uma avaliação de desempenho e o chefe havia lhe dado um mero “regular” no quesito comprometimento. “Mas ele sabe muito bem que esse semestre está difícil na faculdade, que eu tenho que estudar. Minha prioridade é me formar. Além disso, minha mãe ficou doente. O cara sabe disso, não sei porque ele foi tão injusto”, bradava a revoltada profissional.

A amiga dava o maior apoio e, para ajudar mais, começou a tecer comentários sobre as preferências sexuais do superior hierárquico em questão, que, na opinião dela, parecia “meio gay”.

Que bela dupla. A amiga, por falta de um argumento melhor para defender a causa, apela para a clássica mudança de assunto, atacando a conduta do outro (já falei aqui sobre o argumentum ad hominem).

A profissional, se é que se pode chamá-la assim, mostrou claramente a falta de comprometimento, de modo que dá para entender facilmente a nota que ganhou na avaliação. Ela mesma se entregou quando declarou: “ele sabe que a minha prioridade é me formar”.

Ora, vamos pensar com calma. Você tem R$ 1.000,00 para investir. Resolve aplicar R$ 900 no Itaú e R$ 100 no Bradesco. É claro que você tem que esperar um retorno muito maior do Itaú e bem pouco do Bradesco, confere? Matemática básica. Pois se a moça está investindo, vamos dizer, 90% da sua atenção, vontade, dedicação e empenho na faculdade, é lá que ela tem que reclamar os rendimentos. Não no lugar onde ela está aplicando só 10%.

Você resolve ter um filho e, como pessoa consciente, resolve dedicar 80% da sua energia para ele. Beleza, mas é preciso estar ciente que o retorno esperado tem que vir dele mesmo, da convivência entre vocês, das alegrias afetivas, da participação no dia-a-dia. Mas, uma vez que você é uma pessoa só, certamente outras partes da sua vida ficarão com um investimento menor, portanto trarão menos retorno. Não tem nada de errado nisso, cada um tem as suas prioridades entre as muitas demandas do dia-a-dia.

A questão é que a gente tem que esperar retorno do lugar onde está investindo. Não adianta querer ser promovida se a sua prioridade é a faculdade. Também não dá para ver os filhos crescerem se você trabalha 12 horas por dia. Assim como é impossível organizar um megaevento internacional se o amor da sua vida está doente de cama.

A vida é assim, os recursos são limitados e a gente tem que fazer escolhas sobre onde e quanto investir. Além disso, todos os investimentos são de risco, não há como ter certeza do retorno.

O que é preciso ter em mente é que a gente só aufere lucros do lugar onde investiu. Senão, é como chamar o gerente de mau caráter só porque sua conta está negativa.

Aí não dá, né, moça?

Lígia Fascioni | www.ligiafascioni.com.br

Marketing e galinhagem

A revista Veja dessa semana coloca na capa a identidade visual de uma conhecida marca de sabão em pó para anunciar a sua principal matéria: político artificial. À parte do propósito de esclarecer alguns aspectos sobre os motivos da carestia das propagandas eleitorais no Brasil, dois pontos me chamaram a atenção: o título “o marketing e a corrupção” e o fato da equipe de reportagem ter usado as palavras marketing e propaganda como sinônimos o tempo inteiro. E o pior é que a propaganda a que os jornalistas se referiam era justamente aquela enganosa, do mal mesmo.