Será que dá para fazer o redesign da identidade corporativa?

Fotografia: Studio Furia

O que mais se vê por aí, hoje em dia, é gente prometendo turbinar os negócios e aumentar lucros com uma fórmula simples: redesenhar a identidade corporativa de sua empresa.

Se você topou o desafio, provavelmente o que vai ser proposto é nada menos que revolucionar completamente sua marca gráfica*. Os argumentos não variam muito: a atual é muito sem graça, pouco inovadora e já está datada. Há que se tentar uma solução mais moderna, com mais recursos, mais afinada com as tendências.

Os “especialistas” chamam esse sofisticado processo de “redesign da identidade corporativa“. Eles explicam que vão fazer para você um desenho arrojado, inovador e muito criativo que vai diferenciar sua empresa de todas as outras. Vão aplicar isso em todos os lugares e, automagicamente, a marca será reconhecida e valorizada, aumentando seus lucros exponencialmente.

Tudo parece fazer sentido. Contratando um serviço desse naipe, os negócios só podem melhorar mesmo; duvidar, quem há de?

Mas pensemos um pouco melhor. O que é mesmo essa tal de “identidade corporativa” que vai ser redesenhada?

Vamos “desmontar” a expressão e ver o que cada uma das partes significa. Identidade, segundo o dicionário Aulete, é o conjunto de características próprias de uma pessoa, um grupo etc. que possibilitam sua identificação ou reconhecimento. Então, a identidade de uma pessoa é o conjunto de atributos que tornam essa pessoa especial e única. Já a palavra corporativa está associada à empresa, organização, corporação.

Resumindo, a identidade corporativa é o conjunto de características que, combinadas, tornam uma empresa única, como, por exemplo, se ela é ousada, formal, racional, séria, bem-humorada ou preocupada com questões éticas.

Mas como fazer o “redesign” disso tudo? Como mudar a essência de uma empresa simplesmente refazendo a sua marca gráfica?

A resposta é: não dá.

É que marca gráfica não é sinônimo de identidade corporativa, como muitos acreditam. A marca gráfica e suas aplicações são a identidade visual; o que é totalmente diferente de identidade corporativa.

Pense numa pessoa: ela tem um nome, um corpo e usa roupas. O corpo não é a pessoa. O nome não é a pessoa. As roupas não são a pessoa. Todos esses elementos são manifestações físicas da identidade, mas não são a própria identidade.

Se a pessoa (ou empresa) não se conhece bem, pode inclusive de manifestar de maneira a parecer o que não é, mas isso não muda a sua identidade. Quando a pessoa muda de roupa, muda de nome ou muda de corpo (fazendo uma plástica ou engordando, por exemplo), não muda a sua essência, não deixa de ser ela mesma apenas porque as manifestações de sua identidade mudaram.

Uma empresa também é assim. Se ela tem uma postura conservadora para tomar decisões, não é mudando a marca gráfica que ela vai se tornar inovadora.

Assim, antes de desenhar ou redesenhar uma marca gráfica, a empresa precisa se conhecer profundamente. E o designer deve tentar traduzir essa essência usando toda a sua competência e talento; não é fácil.

E tem mais: a marca gráfica, sozinha, não pode tudo. O nome, o ambiente, o atendimento, os brindes, a propaganda, o website, os produtos, as pessoas, a comunicação interna e externa, tudo o que torna a identidade corporativa tangível precisa colaborar.

Para ficar mais claro, basta lembrar o conceito de imagem corporativa. Ao contrário da identidade, imagem não é o que a empresa é, mas o que ela parece ser. Como a imagem está na cabeça das pessoas, ninguém tem controle absoluto sobre ela – é possível, no máximo, influenciá-la.

Uma boa metáfora é imaginar a imagem como uma tela em branco, onde as pessoas vão montando a imagem da empresa como se fosse um jogo de quebra-cabeças. Quem fornece as peças é a própria empresa, com suas ações e comunicações.

Assim, quando um estagiário conta para seus amigos sobre os podres do escritório, ele está espalhando peças. Um telefonema bem atendido, um anúncio de revista ou um erro de português num cartaz são peças que as pessoas reunem para montar a imagem. Se uma empresa contradiz sua essência distribuindo peças que não se encaixam, não apenas está jogando dinheiro fora, mas pagando para se prejudicar.

Assim, se algum profissional lhe oferecer o redesenho da identidade corporativa de sua empresa, desconfie. Ele não sabe o que está propondo…

7 Responses

  1. rodrigo
    Responder
    5 dezembro 2010 at 10:31 pm

    Muito bom.
    vale lembrar de sempre desconfiar de “especialistas” de design que usam os termos “desenho”, “arrojado” , “moderno” e em muitos casos até mesmo o “inovador”

  2. 6 dezembro 2010 at 1:04 am

    Ótimo texto Ligia.
    Parabens!

    Quando vc menciona nao utilizar o termo logomarca, digo que aprendi na faculdade sobre os dois termos, defendidas por professores renomados cada um à sua maneira. É um assunto “polemico” mesmo, eu não digo logomarca mas tambem não recrimino quem o profere. Coincidentemente li uma defesa do termo e achei ate interessante.
    Compartilho aqui com todos: http://www.revistawide.com.br/index.php/logomarca-existe-passa-bem-e-manda-lembrancas/

    Lígia Fascioni: Oi, Richard!

    Obrigada pela contribuição. Eu também não recrimino, principalmente se a pessoa não é da área (clientes, por exemplo), apenas prefiro não usar (e aproveito todas as oportunidades possíveis para esclarecer); mas confesso que fico com um pé atrás com designers que falam logomarca. Com informação, a pessoa que lê também pode escolher.

    Abraços!

    Lígia Fascioni | http://www.ligiafascioni.com.br

  3. Andre Orthey
    Responder
    6 dezembro 2010 at 7:32 am

    Inovador… palavrinha usada a exaustão nos dias de hoje. Realmente hoje muito se fala mas pouco realmente se entende, mas isto é bem característica de nossa identidade social, conhecimento raso sobre o que se fala. Poucos procuram se aprofundar no real significado das próprias palavras que usam…

    Excelente abordagem Ligia, parabéns pela clareza com que vc sempre expõe seus pensamentos.

    Ótimo texto, parabéns!

  4. 6 dezembro 2010 at 6:58 pm

    Olá Lígia,
    Gostei do texto e da ideia. Porém, o perigo da generalização é que não contempla a excepções.
    A identidade visual tem a sua influência, mas de facto, se não for acompanhada pela conduta da empresa não vence.
    Ainda assim, o redesign não tem de ser uma mudança radical e por vezes podemos estar a falar de aumentar a clareza com que se comunica.
    Se uma pessoa for um excelente profissional (por exemplo bancário) e se vestir como um pedinte, pode beneficiar com uma mudança mais concordante com a sua actividade.
    Concordo totalmente que a atitude tem de acompanhar e ser coerente com a Identidade visual. Mas a identidade visual também deve acompanhar a atitude.

    Um abraço
    Daniel

    Lígia Fascioni: Oi, Daniel!
    Muito bem observado. Porém, aquilo não era uma generalização; apenas uma ilustração de um caso corriqueiro, até porque não entro no mérito se o redesign deve ser radical ou sutil (isso depende da identidade corporativa). Obrigada por ter chamado atenção sobre esse ponto, pois mais gente pode ter entendido assim.
    Sobre a sua frase, ela é o resumo perfeito de tudo o que eu quis dizer no texto (ou, pelo menos, tentei…ehehe).

    Abraços!

  5. 7 dezembro 2010 at 7:18 am

    Olá Lígia,
    Gostaria de esclarecer que achei o texto muito correcto e verdadeiro. Porém, entendi que generalizava, o que pode ser perigoso. É que nem toda a proposta de redesign é para desconfiar.
    E penso que conseguiu passar muito bem a sua consideração.

    Abraços
    Daniel

  6. 16 dezembro 2010 at 12:49 pm

    Olá Lígia,
    Estou de acordo que não é possível mudar a essência de uma empresa apenas mudando o seu design, mas claro, uma empresa que não faz mudanças em seu design acaba tornando-se ‘saturada’, bons negócios requerem boas ideias e inovações, gosto de comparar como uma pessoa de penteado novo, roupa nova, então, a imagem gráfica quando mudada, não pode ser feita tão drásticamente, como uma troca de nome, principalmente se esta mudança não tiver a divulgação adequada ou muito vagarosa, deixando muitas vezes os clientes confusos. Em uma empresa na qual presto serviços acompanhei de perto uma mudança de identidade corporativa, na qual mudou tudo comletamente, foi uma experiência bacana, porém não teve uma continuidade forte na divulgação dessa ‘nova’ marca, no que acarretou de a marca atual ter.., digamos assim.., subido um degrau com classe mas ficado por isso mesmo. Também tem um exemplo em minha cidade de uma empresa que fez a mudança corporativa e deu muito certo, aumentando não só o faturamento, mas os clientes e a visão do cliente/empresa, mudou sem dúvidas para melhor.

    Lígia Fascioni: Oi, Maikel!
    Notei uma certa confusão no seu comentário: esses exemplos que você citou de mudança na identidade corporativa, são, segundo você mesmo descreve, mudanças na identidade visual. Justamente o objetivo principal do texto é mostrar que são conceitos completamente diferentes. Por favor, releia o texto com atenção e depois, o seu comentário. Ou então não entendi bem (isso também é uma possibilidade)…
    Abraços e obrigada por contribuir com a discussão!

  7. 20 dezembro 2010 at 5:05 pm

    Como estás?, observei o teu blog e ponderei muito,estou ver que tás a informar muito bem!
    Continua com o bom trabalho!
    abraço

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