O efeito Medici

Sabe quando você lê um livro e acha que alguém leu a sua mente? É claro que eu não teria capacidade nem conhecimento para escrever “O efeito Medici: como realizar descobertas revolucionárias na intersecção de ideias, conceitos e culturas“, mas gostaria muitíssimo de tê-lo feito. Frans Johansson traduziu tudo o que eu penso e mais um montão de coisas; estou encantada.

Ele fala do conceito de inovação que uso até hoje; não basta a ideia ser original, mas precisa também ser valiosa e disponível para uso.

O livro trata basicamente do conceito de intersecção; um espaço na nossa mente onde há mais possibilidade de gerar ideias inovadoras e revolucionárias. Frans usou a família Medici (aquela dos banqueiros mecenas de Florença, não a do nosso general ex-presidente) como metáfora porque eles conseguiram criar e nutrir esse espaço intersecional como ninguém antes. Os Medici reuniram e financiaram escritores, escultores, filósofos, investidores, pintores, poetas e arquitetos, entre outros talentos. Esse caldo cultural rompeu barreiras entre disciplinas e culturas, dando origem a um mundo de ideias diferente de tudo o que se conhecia até então. A mudança foi tão radical e inovadora que a época ficou conhecida como “Renascimento“.

Johansson defende que esse ambiente propício a inovações pode ser recriado quando se combina conhecimentos de áreas diferentes em um mesmo projeto. Como exemplo, ele cita o arquiteto Mick Pearce, nascido no Zimbábue que reuniu técnicas de arquitetura com estudos sobre ecossistemas e conseguiu construir um edifício baseado nos ninhos de cupins no deserto africano. Como resultado, o prédio, inaugurado de 1996, mantém uma temperatura estável entre 22 e 25 °C sem usar sistema de ar-condicionado e usa menos de 10% da energia consumida em prédios do seu tamanho. Ah, e isso na escaldante Harare, capital do Zimbábue. A solução só foi possível porque o arquiteto, competentíssimo, curtia estudar os processos da natureza nas horas vagas.

Ele também conta que o famoso George Soros, o megainvestidor, reuniu sua expertise em finanças com sua paixão pelo estudo da filosofia para criar uma estratégia filantrópica inovadora. Frans relata como uma equipe formada por neurocientistas, matemáticos e cientistas da computação conseguiram fazer o cérebro de um macaco dar instruções para um jogo virtual, entre outras coisas fantásticas.

O autor cita Richard Dawkins, que criou a teoria dos memes, que seriam módulos básicos de ideias que a gente recombina para inventar novas coisas. Os memes seriam o equivalente aos nossos genes; uns morrem de inanição, outros ficam fortes e frutificam. E, na nossa cabeça, os memes ficam em luta constante pela nossa atenção.

Então, para Johansson, a intersecção é um lugar na nossa mente onde memes de diferentes raças e culturas frequentam a mesma balada. A intersecção (bom nome para uma casa noturna) é o ambiente mais propício que existe para recombinar memes de maneira aleatória e inédita e dar origem a coisas extraordinárias que nunca foram pensadas antes.

A ideia é quebrar barreiras associativas entre áreas de conhecimento diversas. Se você é um especialista em genética vegetal (e especialistas são bem-vindos!) seria enriquecedor que você também gostasse de mangás ou técnicas de maquiagem. Sabe-se lá que ideias originais podem sair dessa mistura. Assim, quanto mais curioso você for e mais investir tempo em conhecimentos que nada têm a ver com o seu trabalho, mais seu próprio trabalho poderá ser beneficiado.

Isso pode acontecer tanto em uma pessoa só, reunindo conhecimentos diversos, como em uma equipe, formada por gente que pensa completamente diferente entre si. O ideal é aprender tantas coisas quanto possível sem ficar preso a uma maneira particular de pensar nessas coisas. Então, não basta reunir conhecimentos, mas reuni-los sem preconceitos sobre como eles devem se organizar e se associar (mande embora todos os leões de chácara e libere a bagunça para a festa rolar solta).

O objetivo é criar ambientes propícios à inovação, como no Renascimento. E o homem renascentista é curioso e interessado em áreas aparentemente desconexas.

Depois de ler o livro, fiquei mais animada. Afinal, estudei eletrotécnica, engenharia elétrica, design, marketing e gestão; programei robôs, ilustrei livros, pintei quadros; fiz yôga, capoeira, zumba, sapateado e dança contemporânea; adoro literatura, moda e arte; pilotei motos e amo aprender coisas novas. Ainda não consegui inventar nada original, mas continuo colecionando memes coloridos e promovendo festinhas mentais.

Vai que daqui a pouco aparece uma conexão interessante que nem o Leonardo tinha pensado…

***

PS: Devo novamente agradecer a dica da ótima Denise Eler, que sabe das coisas.

Lígia Fascioni | www.ligiafascioni.com.br

7 Responses

  1. 19 novembro 2010 at 4:53 pm

    Nossa; fiquei encantada com tantas possibilidades e animadíssima em ver o quanto podemos quando queremos.♥

  2. 20 novembro 2010 at 8:48 pm

    Fiquei com vontade de ler o livro! Ainda mais depois de ter visitado Firenze… Hoje fiquei bem feliz de saber que vais estar na nossa pós no seminário dos dias 3 e 4/12. Bj!

  3. 26 novembro 2013 at 7:59 pm

    Acredito que esta entrevista http://globotv.globo.com/globo-news/milenio/v/escritor-thomas-cahill-e-o-entrevistado-do-milenio/2978562/ possa colaborar com este artigo. É uma entrevista com Thomas Cahill que escreveu Hereges e Heróis, abordando a renascença e a revolução do pensamento.

    • Ligia Fascioni
      Responder
      13 abril 2018 at 12:33 pm

      Que pena, o link não está indo para a entrevista. Mas vou procurar com calma depois. Muitíssimo obrigada pela contribuição, minha linda! <3

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