Vendo o que os outros não vêem

Processed with Focos

Dois policiais estão presos num engarrafamento. Estão de boa, pois é só a ronda rotineira. Eis que um deles olha para o lado e começa a admirar uma BMW caríssima. O motorista está fumando e, de repente, simplesmente joga as cinzas no banco do passageiro.

Que absurdo, um dos policiais pensa. Um carro caro desses! Aí começa a pensar: quem faria uma absurdidade dessas? Não o dono, que teve que comprá-lo. Não o amigo que pegou o carro emprestado. Somente alguém que não tenha nenhum tipo de contato com o proprietário, tipo, um ladrão, faria uma coisa dessas. Num estalo, o policial ligou a sirene, acionou o suporte e, de fato, o carro era mesmo roubado. Uma observação à toa gerou um insight que fez toda a diferença no trabalho do policial.

Pois o psicólogo cognitivo Gary Klein tem passado a vida profissional observando como as pessoas tomam decisões e tem um carinho especial por insights. 

Ele faz parte do movimento chamado psicologia positiva. A ideia por trás do conceito é a seguinte: os psicoterapeutas trabalham para que as pessoas com distúrbios ou atormentadas se sintam menos miseráveis. Mas para a psicologia positiva, eliminar a miséria não basta; é preciso trazer algum valor positivo, acrescentar algum prazer.

O princípio que Gary defende é que, para melhorar nossa performance, precisamos de duas coisas: reduzir os erros e aumentar os insights. Por isso ele escreveu “Seeing what others don’t: the remarkable ways we gain insights” (numa tradução livre, algo como “Vendo o que os outros não vêem: as maneiras extraordinárias pelas quais ganhamos insights” — não sei traduzir a palavra insight de maneira que faça sentido, mas seria tipo uma revelação, uma iluminação, uma sacada genial).

Ele coloca a questão em três perguntas fundamentais:

  1. O que dispara um insight?
  2. O que nos impede de reconhecer um insight?
  3. Existe alguma maneira prática de aumentar o fluxo de insights?

AFINAL, O QUE É UM INSIGHT?

Eu escrevi aí em cima que não conseguia traduzir a palavra insight e não é à toa; acho que a gente não tem mesmo um equivalente em português para expressar essa ideia. 

Para Gary Klein, insights são ideias que nos transformam de várias maneiras: a forma como a gente vê, age, sente, entende e deseja.  São mudanças e transições inesperadas que transformam uma ideia medíocre para uma muito melhor.

Os insights mudam a forma como a gente entende, transformando nosso pensamento e vendo o problema sob outro ponto de vista. 

Um amigo do autor diz: “Quando acontece um Insight, tudo o que acontece depois fica diferente”.  

Um insight não pode voltar atrás; você não pode retornar ao momento antes dele”, diz Hilary Mantel.

Gary Klein define como “Uma mudança inesperada para uma história melhor”.

A PESQUISA

O autor fez uma coleção de histórias sobre insights (cerca de 120 exemplos de pessoas que fizeram uma mudança radical em suas crenças) e começou a procurar padrões. Ele entrevistou pessoas, mas aproveitou muita coisa que já estava publicada em jornais, livros e revistas.

Ele descreve em detalhes como fez a análise e como classificou os casos em diferentes estratégias: conexões, coincidências, contradições e desespero criativo (algumas se encaixavam em mais de uma).

Conexões acontecem quando a pessoa “junta os pontos”, ou seja, quando ela é exposta a mais ideias e pega uma nova informação  e combina com uma que ela já tem para fazer a descoberta.

Coincidências: quando a gente percebe uma coincidência, não tem certeza se é apenas um acidente ou se faz parte de um padrão. Uma observação cuidadosa (e curiosa) pode conectar alguns eventos que não pareciam relacionados e dar  origem a ótimos insights. Mas há que se ter cuidado: às vezes, coincidências são só coincidências mesmo.

Contradições: elas disparam reações emocionais do tipo “não pode ser!”, pois não fazem mesmo sentido. Esse sinal de que há alguma coisa seriamente errada na história que temos como referência. Então, o jeito é mudar a história para fazer o encaixe; aí é que surgem os insights, como no caso do exemplo do policial.

Desespero criativo: esse é o nome que o psicólogo Adriaan de Groot dá às estratégias brilhantes que algumas pessoas conseguem inventar quando estão encrencadas. É como encontrar uma saída para uma armadilha inescapável. 

Klein analisa o que dispara o insight (ele agrupa coincidência junto com conexão, para facilitar), a atividade que segue e a conclusão.

Assim, para o caminho da contradição, o que disparar o processo é achar uma inconsistência e faz a pessoa encontrar uma âncora, mesmo que fraca, para redesenhar a história. 

Para o caminho da conexão (que inclui coincidência), a pessoa descobre e acrescenta uma nova âncora que muda a história.

Para o caminho do desespero criativo, a pessoa descarta uma das âncoras da história original para construir outra.

O QUE NOS IMPEDE DE TER INSIGHTS?

Nós estamos o tempo todo fazendo conexões, procurando por implicações, buscando inconsistências e desafiando evidências fracas. Quando estamos no piloto automático, e as conexões e contradições são óbvias, a gente fica cego e simplesmente não as enxerga. O que nos impede de ter insights é simplesmente estupidez. Aliás, a estupidez é o que nos faz ter também falsos insights. Estupidez é não ver o óbvio porque ele é óbvio demais.

As organizações também trabalham contra os insights, uma vez que supervalorizam a previsibilidade e a perfeição; assim não sobra espaço para o inesperado.

DICAS FINAIS

  • Insights surgem espontaneamente; não dá para planejar ou marcar uma hora.
  • Insights são resultado de uma mente ocupada com determinado problema; se ele não for relevante para a pessoa e ela não der bola para ele, nada feito.
  • Pensar alto ajuda a ter insights.

RESUMO

O livro tem muitas histórias, mas, do meu ponto de vista, é um pouco fraco do ponto de vista metodológico. Algumas histórias são interessantes, outras se arrastam em detalhes irrelevantes.

Mesmo assim, penso que vale a pena a leitura. Vai que dá a você algum insight… 

Leave A Reply

* All fields are required